segunda-feira, 11 de julho de 2016

o grande desafio humano

"DÊ A VOLTA POR CIMA E FAÇA ELES PERGUNTAREM: PORQUE ELE AINDA RI?"

 Por Alacir Arruda

Existe uma palavra em alemão que talvez defina bem o  significado de:  “ fico feliz com a desgraça alheia”  - Schadenfreude -  Cuja a tradução literal seria “ alegria no dano” . Bom, afastadas as máscaras da moral cristã, que se revelam  nos desejos destrutivos e o egoísmo extremado do ser humano além de dar à vazão à hipocrisia,  podemos refletir melhor. Quando  alguém se  coloca no centro das atenções, todas suas ações e atitudes são analisadas como se vistas por um microscópio. Isto é, qualquer coisa – por mais normal que faça e que também a maioria das pessoas faz – é motivo de recriminação.

Neste caso, a “Schadenfreude” se dá pelo fato de o sujeito em questão ser descoberto e exposto ao público, enquanto os outros - que, provavelmente, fazem a mesma coisa - permanecem ocultos. Anseia-se destruir o outro quem sabe pelo fato de o mesmo lhe ser semelhante, no intuito de se tentar apagar aquela faceta interior que ninguém quer ver.
Afinal, ao se olhar no espelho nem sempre se gosta do reflexo, principalmente, quando mostra quem realmente se é. E ninguém aprecia ver sua imagem desnuda, com todas suas imperfeições. É melhor ver as imperfeições – mesmo as suas – nos outros.

Eis, pois, a “Schadenfreude”. O gozo em flagrar a corrupção alheia, já que a sua própria escapa impune. Corruptos e calhordas são os outros. É mais fácil viver assim: olhar a hipocrisia no outro, em vez de si mesmo, e clamar para que o outro tenha vergonha na cara, em vez de ter vergonha na cara por si mesmo.

Errados sempre são os outros. Dessa maneira, é bem melhor que olhar a si mesmo diante do espelho e morrer de decepção. 
"Conta-se que numa cidade do interior um grupo de pessoas se divertia com o idiota da aldeia. Um pobre coitado, de pouca inteligência, vivia de pequenos biscates e esmolas. Diariamente eles chamavam o idiota ao bar onde se reuniam e ofereciam a ele a escolha entre duas moedas: uma grande de 400 REIS e outra menor, de 2.000 REIS.

Ele sempre escolhia a maior e menos valiosa, o que era motivo de risos para todos. Certo dia, um dos membros do grupo chamou-o e lhe perguntou se ainda não havia percebido que a moeda maior valia menos.  - Eu sei! Respondeu o tolo. Ela vale cinco vezes menos, mas no dia que eu escolher a outra, a brincadeira acaba e não vou mais ganhar minha moeda.

Pode -se tirar várias conclusões dessa pequena narrativa.

A primeira:
Quem parece idiota, nem sempre é.
A segunda:
Quais eram os verdadeiros idiotas da história?
A terceira:
Se você for ganancioso, acaba estragando sua fonte de renda.
A quarta e mais interessante é:
A percepção de que podemos estar bem, mesmo quando os outros não têm uma boa opinião a nosso respeito.
Portanto, o que importa não é o que pensam de nós, mas sim, quem realmente somos.


-Moral da História 

O maior prazer de uma pessoa inteligente é bancar o idiota, diante de um idiota que banca o inteligente.


os filósofos erram quando dizem que o supremo dever do homem é a busca da felicidade. Mas, se os próprios filósofos declaram que a felicidade, por ser efêmera, não existe, como pode ser dever do homem procurar o que não existe?  Então, humildemente,  eu corrigi os filósofos: por revés, o dever do homem na Terra é buscar ser menos infeliz.

Aí que entra o célebre verso do Ataulfo Alves, o grande sambista: “Eu era feliz e não sabia”. Esse verso é uma adaptação do dito de filósofos, que sempre disseram que o homem muitas vezes não sabe que é feliz. Eu iria mais adiante: o homem só é feliz quando não sabe que é infeliz, o que no fim das contas nada significa. E por outra parte pergunto: não é de todo pertinente que o homem também não saiba que é infeliz?

Eu, de minha parte, garanto que o homem só pode se sentir feliz quando, sem saber, ele é infeliz. Ou de maneira mais radical: só um idiota pode se sentir feliz.

Só pode dizer que era feliz e não sabia quem venha posteriormente a ser tão infeliz que passe a invejar o estado anterior que ostentava.
“Eu era feliz e não sabia” quer dizer que não gozou da felicidade por desconhecer que com ela tratava.
E só agora, que é infeliz, tem consciência de que aquele estado que vivia era o de felicidade.
Ora, quem é feliz e não sabe que é feliz, por lógica, não é feliz.
Em suma, para ser feliz é preciso sentir-se que é feliz.

Já aquele que é infeliz e não sabe, por lógica, é feliz. É uma espécie de loucura delirante, a pessoa sofre e não sabe que sofre, por consequência não sente a dor e o infortúnio quando estes batem à sua porta, invadem seu domicílio e a submetem.
Ou seja, os que são infelizes e o desconhecem ou são muito fortes, ou estão loucos.
Pode-se dizer que são felizes.

É que no meio desses estados existem outros mil, como, por exemplo, o dos que são felizes tão somente por estarem sempre esperando a felicidade. É a felicidade da esperança, a felicidade dos crentes que têm a certeza de que Deus virá para chamá-los para o reino dos céus.
A única felicidade para eles consiste em esperar a felicidade. Isso é o que se chama de sonho.
O sonho é o lenitivo para o sofrimento, sofre-se, mas mergulhando no sonho o sofrimento passa a não doer, passa a não existir, sobrepujado pela esperança.

Além disso, o estado de felicidade é sempre cotejado com a felicidade ou a infelicidade alheia.  É impossível ser feliz se moram ao nosso lado ou convivem conosco pessoas que consideramos felizes. A felicidade alheia, muitas vezes, é a causa única da nossa infelicidade.
Muitas vezes é impossível para nós encarar com naturalidade a felicidade alheia. Ela nos agride e não raro nos torna infelizes. Por todas essas barafundas, não há nada mais difícil, senão impossível, do que ser feliz.

Muitas pessoas só se sentem capazes de agradecer por comparação a quem tem menos ou não tem nada, por comparação a moribundos, miseráveis, destituídos, ou a quem perdeu. É muito freqüente ouvirmos sermões do tipo: “Agradeça por ter um corpo perfeito; por ter uma casa, alimento, saúde, por ser parte de uma minoria privilegiada...”. É a alegria pela comparação com as desgraças dos outros. Na verdade, uma forma vulgar e bem baixa de gratidão. Uma gratidão passiva, fruto de espíritos mais invejosos do que virtuosos. Precisam da miséria, da derrota ou da infelicidade alheia para ser felizes. É a alegria por saber que se tem o que o outro não possui. Emerge somente por comparação, por meio de um olhar invejoso e competitivo. É uma forma infeliz de gratidão. Tem o mal do outro como condição.

A gratidão, antes de ser um consolo ou um sentimento de dívida, pode ser um ato. O ato simples de usufruir do que se tem e do que se pode. Ser grato, em seu sentido mais virtuoso, é dar valor ao que se tem. E para isso é preciso ter olhos para o que já existe e é capaz de produzir prazer.

Muitos nos chegam, em desespero, relatando que suas vidas estão em ruínas, aos pedaços. Os primeiros passos, muitas vezes, obviamente, são os de recolher cacos e tentar aproveitar o que sobrou. Esta tentativa, por mais estranho que pareça, é um movimento de gratidão. E ela, se possível, na melhor das hipóteses, deve se dar sem a comparação com uma miséria alheia maior.

Há quem tenha sido condicionado a se sentir feliz somente por comparação com os outros. Ou seja, ser feliz é ser ou ter mais que o outro, é ostentar superioridade. É uma felicidade social, de coluna social. Para quem foi assim condicionado, fica mesmo muito difícil ser feliz sozinho (no seu bom sentido), no seu cantinho, sem se preocupar demais com os outros. Segundo Russell:

“O homem sensato não deixa de sentir prazer com o que tem pelo fato de alguém ter mais ou melhor. A inveja, na realidade, é uma forma de vício, em parte moral, em parte intelectual, que consiste em não ver as coisas em si mesmas, mas somente em relação com outras. (...) Quem deseja a glória, poderá invejar Napoleão. Mas Napoleão invejou César. César invejava Alexandre e Alexandre, provavelmente, invejava Hércules, que nunca existiu. Não se pode, por conseguinte, combater a inveja só por meio da conquista da glória, pois haverá sempre, na história ou na lenda, algum personagem cujos feitos tenham sido mais gloriosos. Pode-se combatê-la, sim, pelo gozo dos prazeres que se nos oferecem, pelo trabalho que tivermos de realizar e evitando comparações com aqueles que imaginamos, talvez sem razão, mais ditosos do que nós.”