quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

O Prêmio Nobel e o Brasil


Alacir Arruda

Alguém certa vez escreveu que o Brasil dá mais valor em ganhar uma Copa do Mundo de futebol do que ter um prêmio Nobel em qualquer área do conhecimento. Fui checar o assunto no semideus da informação, o Google. E resolvi espichar a pesquisa para toda a América Latina.
O prêmio Nobel é distribuído desde 1901 nas áreas de Química, Física, Medicina, Paz e Literatura. Em 1969 foi acrescentado o de Economia. O Brasil não tem mesmo nenhum prêmio Nobel.
Carlos Chagas foi indicado em 1921 para medicina, mas não levou. Outro indicado de fora para dentro foi Dom Helder Câmara para o da Paz e não levou também. É realmente intrigante como o mundo olha o Brasil.
Em Literatura a América Latina recebeu os prêmios Nobel em 1945 com Gabriela Mistral do Chile; em 1967 com Miguel Astúrias da Guatemala; em 1971 com Pablo Neruda do Chile; Octávio Paz do México o levou em 1990 e Gabriel Garcia Márquez da Colômbia em 1982. Não sei se o Brasil teve pelo menos alguém indicado para Literatura.
Latino-americanos receberam Nobel da Paz. No geral, foram dados a pessoas que combatiam algum tipo de ditadura nesse ou naquele país ou momento. Saavedra Lamas, Argentina, 1936; Garcia Robles, México, 1982; Perez Esquivel, Argentina, 1980; Oscar Arias, Costa Rica, 1987; e Rigoberta Manchu, Guatemala, 1992. A pequena Guatemala tem dois Nobel e o Brasil nenhum.
Na área de Química a América Latina teve dois laureados. Federico Leloir, 1971, nasceu em Paris, mas se fez profissionalmente na Argentina, e Mario Molina, México, 1996.
Na de Medicina, receberam o Nobel Cesar Milstein, Argentina, 1984; Alberto Houssay, Argentina, 1947 e o venezuelano, Baruj Beuacerraf em 1980.
São 15 prêmios Nobel para a América Latina, sendo dois terços deles da Paz e Literatura. Os argentinos levam cinco prêmios. Goleada no Brasil.
Numa conta grosseira,  seriam quase 480 prêmios Nobel distribuídos desde 1901. A América Latina tem algo como 3% do total. É muito pouco. E desses somente cinco nas áreas Médica e de Química.
A situação do Brasil é quase vexatória. O interessante é que não recebemos o tal prêmio nem nas áreas de Literatura e da Paz. Mesmo na época da ditadura militar, em que gente como Helder Câmera mostrava a cara contra o regime que o mundo lá fora condenava, não se teve um da Paz. Perez Esquivel o recebeu por combater a ditadura na Argentina, aqui não.
As universidades norte-americanas falam que os latino-americanos quase não contribuem para a evolução da humanidade. Que não se encontra nada que a região tenha feito ou produzido que ajudou a melhorar a qualidade da vida no mundo. Se olharmos pelo prisma do prêmio Nobel parece que eles  têm razão.




quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

O AMOR

Schopenhauer e a metafísica do amor

Alacir Arruda
       
    Por vários motivos Schopenhauer é o meu Filosofo predileto. Se não bastasse seu pessimismo em relação a humanidade, que é a coisa que mais me atraí em seu pensamento, ele foi o primeiro a estabelecer uma ponte entre a filosofia ocidental, dura e tecnicista com a harmonia e simplicidade da filosofia oriental muito mais voltada à reflexão. Por ultimo, minha admiração se completa por ele ser o único filosofo que trata do amor, mesmo que de forma biológica. Por dois motivos, segundo Schopenhauer, o amor merece ser considerado em toda sua importância. O primeiro é de que os poetas fazem do amor o tema e preferencial em suas obras dramáticas, trágicas, cômicas ou românticas. As mais perfeitas e imortais são Romeu e Julieta, Nova Heloísa e Werther. Se os poetas lhe dão tanto crédito não é por força da retórica e da fantasia, mas por força da importância natural do tema e é isso que faz a poesia merecer interesse por parte da humanidade, pois só o que é manifestação da verdade merece crédito e a poesia não seria uma verdadeira arte se não falasse a verdade. 
      Os poetas são assim testemunhos fidedignos do merecimento que o amor tem como tema dispensador de investigação. O segundo motivo vem da experiência. O cotidiano é farto em exemplos onde, personagens não literários, mas sim pessoas de carne e osso, levados pelo sentimento do amor, chegam a ultrapassar o razoável envolvendo-os nos negócios privados ou do Estado, a ponto de cometer assassinato, suicidar-se ou ser levados ao manicômio.
     Então, pelo papel de primeira ordem que o amor ocupa na vida humana é de se estranhar, diz Schopenhauer, que os filósofos pouco ou nada tenham se preocupado com esse tema. E os que se debruçaram, tal como Platão, Rousseau, Kant e Spinoza, o fizeram ou de forma equivocada ou superficialmente. Platão, por exemplo, trata a questão bem longe do seu habitat natural, ou seja, o impulso físico ou o instinto sexual, levando-o às alturas da fábula e do mito. Nem Platão nem os espiritualistas compreenderam que o amor em nada é abstrato, mas que é algo bem material e determinado, enraizando-se no “instinto natural dos sexos”.
    Toda paixão amorosa é apenas um impulso sexual bem determinado e individualizado. Em toda paixão amorosa trata-se sempre de uma metade encontrar uma outra metade, trata-se de todo João encontrar a sua Maria, em vista de algo grandioso, objetivo último de toda atração amorosa: a geração e o futuro da espécie. Nada além disso. Mas isso é o sério da questão. Compreender que toda paixão amorosa tem em vista a perpetuação da espécie é ter ultrapassado o adorno que envolve o amor para alcançar o seu núcleo essencial. Com efeito, diz Schopenhauer, “não se trata aqui, como nas demais paixões humanas, de uma desgraça ou de uma vantagem individual, mas da existência e constituição especial de todo gênero humano futuro; e desse modo, a vontade individual transforma-se em vontade da espécie” (Schopenhauer, 2004, p. 83). Essa é, diz Schopenhauer, a chave da questão do amor, desde a mais fugaz inclinação até a paixão mais avassaladora.
    Dessa forma, o tema do amor se conecta com o núcleo duro da filosofia de Schopenhauer, ou seja, a vontade cega, a vontade de viver, ínsita em todo ser. De tal forma que as vicissitudes da vontade individual ou da “necessidade subjetiva”, envoltas no impulso sexual, não passam de meras ilusões da consciência. Sempre que uma metade se junta a outra, que um João encontra a sua Maria, o que está em questão são sempre os estratagemas da vontade da natureza para atingir seus fins, no caso a constituição das gerações futuras. O sentimento individual, nesse caso, é apenas uma máscara ilusória, o que importa mesmo é o filho que surge duma relação amorosa. “Que uma criança determinada seja gerada, é este o verdadeiro alvo de todo romance de amor, embora os envolvidos não tenham consciência disso: a intriga que leva ao desenlace é coisa acessória” (Schopenhauer, 2004, p.84). Isso pode parecer chocante às almas românticas e sentimentais, mas a natureza não se importa com sentimentalismos. E estes deveriam ponderar se pode haver maior finalidade na vida do que perpetuar a própria vida. De que valem os sentimentos impossíveis e suas quimeras ideais comparado com o futuro da geração? Somente esse elevado fim pode justificar os tormentos e incidentes com que o amor está envolto. Assim como nos momentos mais encantadores sempre está, sorrateiramente, a vontade da natureza pela reprodução. Em todos os passos do amor é a vontade de vida que os conduz. Em cada atração do olhar e união final, a fusão num único ser, o ser a ser gerado será a prolongação da sua existência. Ao contrário, na aversão mútua, o que a natureza impede é uma constituição sem harmonia e infeliz do filho. Por isso a natureza faz de alguns, homossexuais, pois se gerassem enfraqueceriam a espécie. Eis a astúcia da natureza cumprindo a sua vontade.
     O que importa é a sobrevivência da espécie, afirmação da vontade, e para tal se vale da sexualidade para alcançar seu fim. Para isso pouco importa se o indivíduo precisa ser sacrificado, a natureza é insensível ao indivíduo, importando-se somente com a idéia da humanidade. Se uma pessoa morre, outra nasce no seu lugar. Assim, por trás de cada amante, cada casal formado, está o Em-si cósmico, arquitetando a espécie através do instinto sexual. Por trás do enlace amoroso está a vontade que quer se perpetuar, mesmo que os indivíduos não tenham consciência disso. Por isso os casais brigam, mas estão de acordo no quesito sexo. Pode até faltar a correspondência psicológica, mas ambos se dão no prazer físico. Astúcia da natureza e da vontade, nada mais. O que importa é que a criança seja gerada e a geração futura mantida. É o filho ausente que dirige o amor cego. O amor é cego, e nem precisa enxergar, pois alguém, invisível, vê pelo casal.
     Portanto, no amor entre dois seres o que está em questão nunca é a felicidade efêmera dos indivíduos envolvidos. A felicidade individual é uma promessa ilusória para que o gênio da espécie possa cumprir o seu objetivo que é a perpetuação da própria espécie. Para isso ela se vale da ilusão do instinto fazendo passar por bem individual o que na verdade é o próprio bem da espécie. “Portanto, a busca zelosa e apaixonada da beleza, a escolha cuidadosa a que se procede, não se referem ao interesse pessoal de quem escolhe, embora este assim o suponha, mas se referem ao fim verdadeiro, ao ser futuro, no qual deve ser mantido o tipo da espécie da maneira mais integral e pura possível” (Schopenhauer, 2004, p.87).
       Decifrado o enigma do amor, Schopenhauer passa a fazer algumas observações acerca da diferença entre o homem e a mulher e das qualidades físicas e psíquicas de ambos. Na relação amorosa, diz Schopenhauer, o homem inclina-se por natureza à inconstância enquanto a mulher tende à constância e a fidelidade. O amor do homem declina desde o instante da conquista e da satisfação. O que lhe atrai é a outra. Ele anseia pela mudança. Na mulher o amor aumenta a partir da conquista e satisfação. Isso não é uma escolha. É a natureza que assim determina. Essa é uma conseqüência da finalidade da natureza que tudo faz para conservar e, por conseguinte, para o maior aumento possível da espécie. A natureza dispôs as coisas de tal forma que possibilita ao homem gerar mais de cem crianças em um ano, se tiver esse número de mulheres à disposição, enquanto a mulher, ainda que tivesse o mesmo número de homens, não poderia gerar mais do que um único filho por ano, (salvo o nascimento de gêmeos). Por isso o homem está sempre em busca de outras mulheres enquanto a mulher permanece ligada a um único homem, pois a natureza a impele instintivamente a conservar ao seu lado aquele que provê e protege a prole. “Decorre daí que a fidelidade conjugal é artificial para o homem e natural para a mulher, portanto, o adultério da mulher, em razão das conseqüências que acarreta, e por ser contrário à natureza, é muito mais imperdoável que o do homem” (Schopenhauer, 2004, p. 91).
   Quanto às qualidades físicas e psíquicas, Schopenhauer desce aos detalhes dizendo que o gosto individual na atração amorosa é apenas aparente, o que conta mesmo é o instinto de procriação disfarçado sob a atração aparentemente subjetiva. Esse instinto leva em conta a idade da mulher fazendo o homem desejar uma mulher nova, mas nunca uma mulher que já não menstrua. “Juventude sem beleza sempre tem algum atrativo, mas beleza sem mocidade não tem nenhum” (Schopenhauer, 2004, p.91). Qual o motivo dessa preferência? A procriação. Além da idade é fundamental a saúde, o esqueleto, os dentes, a plasticidade, os seios. Por estética? Não, por instinto de reprodução. As mulheres muito gordas nos repelem porque o exagero de gordura é indicativo de esterilidade. A beleza do rosto (nariz, olhos, boca) vem em último lugar. No homem a mulher tem em alta consideração os que se encontram entre trinta e trinta e cinco anos porque essa é a idade apogeu da força geradora. A beleza no homem é secundária, sobretudo a beleza do rosto. A mulher toma para si a tarefa de transmitir à criança a beleza do rosto. A mulher se inclina diante da coragem e a força do homem, em vista da proteção da prole. Por essa razão a mulher muitas vezes ama homens feios, mas nunca efeminados, pois essa deficiência a mulher não pode neutralizar com a suas qualidades.
       Quanto às qualidades psíquicas a mulher busca no homem o caráter, a vontade firme, a retidão, a decisão e a coragem. A criança herda do pai essas qualidades. As qualidades intelectuais no homem não atraem instintivamente a mulher porque essas virtudes não são herdadas do pai, mas da mãe. Assim diz Schopenhauer,
Com freqüência se vê um homem de boa constituição, espirituoso e delicado ser preterido em favor de um outro feio, estúpido e grosseiro. Igualmente são feitos casamentos por amor entre pessoas extremamente diferentes sob o ponto de vista do espírito: por exemplo, ele é rude, forte e estúpido; ela, delicada, impressionável, instruída, de pensamento refinado, senso artístico; ou então ele, é muito sábio, talentoso enquanto ela é uma néscia (Schopenhauer, 2004, 94).
     Schopenhauer segue aqui a doutrina oriental do yin e do yang, isto é, no amor coordenado pelo instinto o que importa é um equilíbrio do feminino com o masculino para a integridade do filho, razão última de todo enamoramento.


 VÍDEO SOBRE A VISÃO SCHOPENHAUERIANA DO AMOR





terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

ATÉ QUANDO?

Alacir Arruda

Quem é do Mato Grosso e acompanha meu Blog já deve ter percebido que nunca comento questões locais em meus artigos, procuro ser genérico nas minhas avaliações e evito tocar em assuntos regionais. Mas existe um ponto fora da curva que tem me incomodado alem do normal, que é a violência desenfreada em Cuiabá e Várzea Grande. Nesta segunda feira, 24 de fevereiro de 2014, uma moça de 19 anos foi assassinada em seu local de trabalho com um tiro na cabeça em pleno centro de Cuiabá de forma bárbara.
Resolvi então quantificar apenas os últimos 7 dias. No final de semana de 15 e 16 de fevereiro e 22 e 23 foram mais de 15 assassinatos, media de dois assassinatos por dia num universo de 900 mil pessoas que compõe a região metropolitana de Cuiabá. Em 2012 foi lançado o primeiro ‘Estudo Global sobre Homicídios’ lançado pelo Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crimes ( UNODC). Esse documento mostrou que há 22,7 homicídios para cada 100 mil habitantes no Brasil. Esse índice só é inferior ao da Venezuela (49 por 100 mil) e ao da Colômbia (33,4). Considerando o ranking mundial, o Brasil está em 26° lugar. A situação mais grave de acordo com o índice de mortes para 100 mil habitantes é de Honduras: 82,1. Segundo números absolutos, porém, Brasil registrou a maior quantidade de homicídios do mundo: foram 43.909 vítimas em 2009 (dados mais atualizados);  seguido pela Índia
Se levarmos em conta apenas os dados relativos em Cuiabá chegaremos a um número preocupante, mais de 66,6 homicídios para grupos de 100 mil pessoas, quase o dobro do pais mais violento da America do Sul, Venezuela. Usando ainda como parâmetro os dados da ONU o numero de mortos per capta em Cuiabá e Várzea Grande supera o de países em Guerra. Essa pesquisa ainda conclui que  hoje é mais seguro você caminhar por Damasco, capital da Síria, Cabul, Capital do Afeganistão e Bagdá, capital do Iraque ( todos países em Guerra) que em Cuiabá. Isso não pode ser encarado pela população  como “normal”.
Mas o que justifica esses dados alarmantes? Porque somos tão violentos? Numa tentativa de sistematizar a grande variedade e quantidade de causas da violência apontados pelos dados, procurei classificar a violência em função de como o ambiente em que elas se encontram estão relacionados aos que praticam a violência, num modelo que guarda muita semelhança com a proposta de Bronfenbrenner (1996). Dessa forma, foram estabelecidas duas grandes categorias: causas contextuais e causas pessoais. As causas contextuais foram divididas em duas subcategorias, de acordo com sua maior ou menor proximidade em relação aos agressores: causas contextuais distais e contextuais proximais.
As causas contextuais distais mais freqüentemente citadas são as produzidas pela conjuntura econômica, social, política e cultural, a exemplo de pobreza, miséria, fome, desemprego, discriminação e marginalização social, violação de direitos humanos, má distribuição de rendas, exclusão social, hegemonia de valores individualistas, impunidade de criminosos, contraventores e corruptos, cultura da violência, narcotráfico, autoritarismo, abandono de crianças. Sua presença é marcante no sentido de que moldam todo um modo de ser e de funcionar de uma sociedade.
Causas contextuais proximais seriam eventos relacionados à violência que estão presentes no ambiente e com os quais os indivíduos que praticam a violência têm contato direto. Modelos de violência em casa, na rua e nos meios de comunicação, desorganização ou desestruturação familiar, uso predominante de punição para promover a disciplina em diversas instituições sociais (família, escola, religião, Febem, etc) são exemplos encontrados em vários trabalhos sobre violência.
As causas pessoais, próprias dos indivíduos que praticam a violência, podem ser exemplificadas por consumo de drogas e álcool, desequilíbrio emocional, questões passionais, estresse, temperamento, natureza ou índole da pessoa, auto-estima muito alta (Loeber et al., 1997) ou baixa (Emery et al., 1998) etc.
Cuiabá e Várzea Grande, em função do Mundial de 2014, vêm passando por um processo de transformação social e econômica jamais visto na história, existe um fluxo muito grande de pessoas de outros Estados que se dirigem para essa região em busca de oportunidades e isso pode ser um dos fatores que explicam esse aumento da violência. O que mais preocupa a população porem, é a inércia por parte do poder publico diante desse quadro. Não vejo nenhum esforço por parte daqueles que recebem para nos garantir um mínimo de segurança no sentido de reverter esse quadro. Alguns chegam a encarar essa situação com naturalidade.
Todos sabemos que a violência possui inúmeras causas e a sua diminuição esta relacionada a uma serie se ações afirmativas porém, faço um Alerta! "Todas as vezes que o povo se calou diante da inoperância do poder publico, o caos se instalou."Ja passou da hora da população cuiabana e várzea-grandense se mobilizar no sentido de cobrar ações efetivas dos nossos governantes sob o risco de sermos considerados coniventes com essa situação.

Gabriel o Pensador: ATE QUANDO?







segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

porque sou agnóstico..

PORQUE ME MANTENHO AGNÓSTICO...

Alacir Arruda

Uma curiosidade que tenho certeza paira pela cabeça de meus alunos é quanto às minhas crenças. Tenho certeza, até pela incisão do meu discurso contrário à religião,  que  muitos pensam que sou Ateu, ledo engano, ja disse por varias vezes que não admiro  os Ateus por  manterem um discurso tão radical, quanto a inexistência de Deus,  que acabam por se  nivelar aos religiosos extremistas que defendem Deus.  Portanto me mantenho agnóstico, que é uma especie de ateísmo moderado. Onde reside essa discussão?  Como ser humano que somos, herdamos a maior parte de nossas opiniões. Somos herdeiros de hábitos e costumes mentais. Nossas crenças, assim como o estilo de nossas roupas, dependem do local em que nascemos. Somos moldados e formados pelo ambiente que nos circunda. O ambiente é um escultor – um pintor.
Se tivéssemos nascido em Constantinopla, (antiga capita do império romano no oriente atual Istambul)  a maioria de nós diria: “Não há qualquer Deus senão Alá, e Maomé é seu profeta”. Se nossos pais vivessem nas margens do Ganges, seríamos adoradores de Shiva, sequiosos pelo céu de Nirvana.
Por via de regra, os filhos amam seus pais, acreditam no que eles dizem e orgulham-se muito de dizer que a religião de seus pais lhes é satisfatória.
Em grande parte os indivíduos amam a paz; não gostam de desavenças com seus vizinhos; gostam de companhia; são sociais; gostam de perseguir seus objetivos acompanhados; odeiam a solidão.
Os escoceses são calvinistas porque seus pais eram. Os irlandeses são católicos porque seus pais eram. Os ingleses são episcopais porque seus pais eram. Os americanos são divididos em centenas de seitas porque seus pais eram. Esta é uma regra geral, com muitas exceções. Os filhos às vezes são superiores aos seus pais, modificam suas idéias, seus costumes, e chegam a conclusões diferentes. Mas normalmente a divergência surge de modo tão gradativo que mal se percebe, sendo comum insistirem que estão seguindo os passos dos pais.
Historiadores cristãos afirmam que a religião de uma nação algumas vezes foi repentinamente mudada, e milhões de pagãos foram transformados em cristãos sob o comando de um rei. Os filósofos não concordam com esses historiadores. Nomes foram alterados, altares foram destruídos, mas as opiniões, os costumes e as crenças permaneceram as mesmas. Um pagão, subjugado pela espada de um cristão, provavelmente mudaria sua posição religiosa; um cristão, com uma cimitarra em seu pescoço, espontaneamente se tornaria um maometano. Na realidade, por dentro, ambos continuam sendo exatamente o que eram antes.
A crença não está sujeita à vontade. Os homens pensam como precisam pensar. Crianças não crêem, nem podem crer, exatamente no que lhes foi ensinado. Elas não são totalmente idênticas aos seus pais. Elas diferem em temperamento, em experiência, em capacidade, em atmosfera. Apesar de imperceptível, há uma mudança contínua. Há desenvolvimento, há crescimento consciente e inconsciente; comparando-se longos períodos de tempo, percebe-se que o velho foi quase totalmente abandonado, quase totalmente sobreposto pelo novo. O homem não é capaz de permanecer imutável. A mente não pode ser ancorada. Se não avançarmos, vamos retroceder. Se não crescermos, vamos definhar. Se não nos desenvolvermos, vamos atrofiar.
Como a maioria de vocês, fui criado entre pessoas que sabiam – que estavam convictas. Não tinham motivos para questionar ou investigar. Não tinham dúvidas. Sabiam-se possuidoras da verdade. Em suas crenças não havia suposições, não havia talvez. Elas tinham a revelação de Deus. Conheciam o início de tudo. Sabiam que Deus havia começado a criação numa segunda, quatro mil e quatro anos antes de Cristo. Sabiam que na eternidade anterior àquela manhã ele não havia feito nada. Sabiam que ele levou seis dias para criar a Terra – todas as plantas, todos os animais, toda a vida e todos os globos que giram no espaço. Sabiam exatamente o que havia feito em cada dia e quando descansou. Sabiam qual era a origem, a causa do mal, de todos os crimes, de todas doenças e da morte.
Conheciam não apenas o começo, mas também o fim. Sabiam que a vida tinha dois caminhos, um largo e um estreito. Sabiam que o caminho estreito, cheio de espinhos e urtigas, infestado de víboras, molhado de lágrimas, manchado por pés sangrentos, conduzia ao céu; e que o caminho largo, plano, ladeado por frutas e flores, repleto de riso, música e felicidade conduzia diretamente ao inferno. Sabiam que Deus estava fazendo todo o possível para escolhessem o caminho estreito, e o Demônio usando todas artimanhas para que escolhessem o caminho largo.
Sabiam que havia uma batalha perpétua entre os grandes Poderes do bem e do mal pela posse das almas humanas. Sabiam que, muitos séculos atrás, Deus deixou seu trono e veio a este pobre mundo na forma de um bebê – que morreu pelos homens – a fim de salvar uns poucos. Também sabiam que o coração humano encontrava-se totalmente depravado, que o homem naturalmente amava o mal e odiava a Deus com toda sua força.
Ao mesmo tempo, sabiam que Deus havia criado o homem à sua imagem e semelhança, e que estava perfeitamente satisfeito com sua obra. Também sabiam que o homem havia sido corrompido pelo Demônio, que com embustes e mentiras enganou o primeiro ser humano. Sabiam que, como conseqüência disso, Deus amaldiçoou o homem e a mulher; o homem com o trabalho, a mulher com a escravidão e a dor, e ambos com a morte; e que também amaldiçoou a própria Terra com espinhos e abrolhos. Tinham conhecimento de todas essas coisas sagradas. Também sabiam tudo que Deus havia feito para purificar e elevar a humanidade. Sabiam tudo sobre o dilúvio; sabiam que Deus – com exceção de Noé e sua família – havia afogado todos os seus filhos – tanto os jovens quanto os velhos, tanto os bebês quanto os patriarcas, tanto os homens quanto as mulheres, tanto as mães amorosas quando as crianças felizes –, pois sua misericórdia dura para sempre. Também sabiam que havia afogado todas as bestas e aves – tudo que caminha, rasteja ou voa –, pois seu amor se estende por todas as suas criaturas. Sabiam que Deus, no intuito de civilizar seus filhos, devorou alguns com terremotos, destruiu outros com tempestades de fogo, matou alguns com raios, milhões com fome, com pestilência, e sacrificou inúmeros milhares nos campos de batalha. Sabiam que era necessário crer em tais coisas e amar a Deus. Sabiam que a salvação só poderia vir através da fé e do purificante sangue de Jesus Cristo.
Todos que duvidassem ou contestassem estariam perdidos. Viver uma vida moral e honesta – honrar seus contratos, cuidar de sua esposa e filhos, construir um lar feliz, ser um bom cidadão, um patriota, um homem justo e reflexivo – era simplesmente um modo respeitável de ser condenado ao inferno.

Em suma, como não carrego certeza de absolutamente nada prefiro me manter a margem dessas discussões sectárias e que no final não chegam a nenhuma conclusão a não ser a certeza,  de que não temos temos  certeza de nada.
Sou um admirador inconteste de Jose Saramago, proeminente escritor português que recebeu o premio Nobel de Literatura em 1998, alias o único escritor de língua portuguesa a receber esse premio. Em 2008 ele participou de  uma sabatina organizada pelo Jornal Folha de São Paulo cuja a parte pais interessante  que achei, esta no vídeo abaixo..

ENTREVISTA DO ESCRITOR PORTUGUÊS JOSE SARAMAGO A FOLHA DE SÃO PAULO 



sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

racismo estudar para ENEM

O RACISMO E A POLÍTICA DE COTAS

Alacir Arruda
  Um dos grandes questionamentos modernos quanto a igualdade racial reside na “questionável” política de cotas do Governo Federal. Para muitos, o governo tenta resolver uma questão histórica e até antropológica com um decreto, para outros é o primeiro passo para a auto-afirmação do negro em uma sociedade claramente racista. No Brasil, não há uma verdadeira democracia racial, mas o fundamento para sua construção reside nos preceitos constitucionais que tornam, perante a lei, irrelevante a auto-classificação racial das pessoas e crime a discriminação. Se a aplicação da lei é falha, a solução não está em oficializar desigualdades, aplicando critérios legalmente diversos para negros e brancos.

      As quotas partem do pressuposto de que os “negros” não estão conseguindo competir com os brancos no vestibular. De fato, isto é verdade na medida em que esta população enfrenta obstáculos sociais muito sérios na sua trajetória escolar, que dificultam o acesso ao ensino superior. Alguma coisa precisa ser feita para diminuir esta desigualdade. Mas a solução das quotas não se encaminha no sentido de propor uma ação afirmativa que permita aos brasileiros com ascendência africana superar deficiências do seu processo de escolarização e o estigma da discriminação mas a de reivindicar que, para os “negros”, os critérios de admissão precisam ser menos rigorosos. Segregam-se os mecanismos de entrada: um mais rigoroso, para brancos e orientais e outros menos rigoroso para “negros”. Por menos que se queira, as implicações negativas são inevitáveis: a universidade ficará dividida entre os alunos da quota, menos bem preparados, e os demais, que ingressam com uma formação melhor.

         Não podemos admitir que as dificuldades de ingresso dos “negros” no ensino superior se devam a características genéticas dos descendentes de africanos que os tornem incapazes de atingir um bom desempenho escolar. Mas, ao oficializar a “raça” como critério de admissão, pressupomos que todos os portadores de traços “negróides”, mesmo os de família de faixa de renda mais elevada, filhos de pais mais escolarizados, e que tiveram melhores oportunidades de receber uma boa formação escolar, são igualmente incapazes de competir com os brancos e que por isso devem ser igualmente beneficiados pelo sistema de quotas. Fortalece-se, deste modo, a falsa identificação entre ascendência africana e inferioridade intelectual, ao pressupor que nenhum negro pode competir com os brancos. É o perigo deste tipo de generalização que tem levado muitos estudantes universitários negros a se oporem ao sistema de quotas. 

     Uma outra conseqüência negativa deste tipo de reivindicação é que ela de fato desvaloriza a boa formação escolar básica, como se ela não fosse necessária para o prosseguimento dos estudos. O importante parece ser conseguir um lugar na universidade e não criar oportunidades de formação que permitam às pessoas que são vítimas de discriminação, disputar um lugar na universidade. Esta desvalorização acarreta um risco: o de que esta distinção inicial se perpetue por todo o curso porque, infelizmente, a qualidade da formação escolar anterior é um fator que influi fortemente no sucesso escolar posterior tanto no caso dos brancos como no dos negros. Alunos que ingressam no ensino superior com sérias deficiências em sua formação, como as que referem à capacidade de compreensão de textos, de redação, de clareza na argumentação, de familiaridade com o método científico, de utilização do raciocínio matemático, encontram grandes dificuldades para conseguir um desempenho satisfatório nos cursos universitários. 

     Além disto, há também deficiências de informação na área das ciências, da literatura, da história e da geografia que limitam o horizonte cultural daqueles que não tiveram oportunidade de cursar boas escolas que precisariam também ser corrigidas. Para serem bem sucedidos, os alunos da quota menos bem preparados necessitariam de um programa paralelo que lhes permitisse superar essas deficiências de sua formação. Esta não é uma tarefa que as universidades possam desempenhar durante os cursos regulares, porque este trabalho exige competências específicas por parte dos professores e uma pedagogia adequada. Além do mais, isto poderia significar a formulação de cursos ou currículos específicos para os alunos negros, o que por sua vez, segregaria os estudantes universitários em programas para negros e programas para brancos. Solução muito melhor seria que esta compensação curricular fosse oferecida antes do ingresso no ensino superior e não depois.

     Chegamos com isto mais perto das raízes do problema da desigualdade de acesso ao ensino superior e da formulação de ações afirmativas que permitam compensar o processo cumulativo da desigualdade da formação escolar prévia. Porque, se não há discriminação racial no vestibular, é preciso reconhecer que não podemos continuar a conviver com um processo educativo que, de fato, exclui a população de ascendência africana do acesso às universidades públicas.



quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

VERDADEIRA FACE PETISTA: O FASCISMO

Por Alacir Arruda

A cada dia que passa  me convenço mais que o PT não é um partido político, mas uma  Irmandade Corrupta e Fascista.  A declaração da Presidenta Dilma, feita  a  agência Reuters de noticias,  de que usará as Forças Armadas para reprimir protestos durante a  Copa do Mundo,   vem  confirmar essa minha desconfiança. Se já não bastasse enfiar o Brasil na maior  crise entre os emergentes, com uma inflação que esse ano deve chegar a 12%, criar subsídios (bem generosos) às empreiteiras que realizam obras da Copa via BNDES, usar do poder para influenciar votações de interesse  duvidoso junto ao Congresso além de apoiar o Regime Fascista da Venezuela, que mata e prende opositores, agora a presidenta Dilma resolveu radicalizar: “Colocarei as Forças Armadas nas ruas”, durante o mundial de futebol.
A  historia dessa senhora passa por manifestações, em 1971 ela foi presa acusada de terrorismo e, segundo ela mesmo afirma, foi torturada pelo regime vigente à época. Querer punir jovens por manifestarem contra aquilo que não aprovam não seria usar o mesmo antídoto? Qual seja, a repressão pela força?  Cara Presidenta, caso a senhora não saiba, a Constituição Brasileira em seu artigo 5º  Inciso 4º   estabelece que:  “ é livre a manifestação sendo vedado o anonimato”. Ou seja, qualquer cidadão brasileiro que sinta-se ofendido em seus direitos e garantias individuais ou coletivas tem, não apenas o direito, mas o dever de manifestar seu pensamento , posicionamento político ou ideologia, não foi isso que a senhora fez em 1970?
Mas ai vem os moralistas  apedeutas dizer: “Mas Alacir, eles quebram tudo, são baderneiros ou como a Globo os cunhou: vândalos”.   Não vou entrar nesse mérito pois sei muito bem, como sociólogo que sou, quais são os fatores objetivos que essas manifestações carregam. Minha crítica é circunscrita ao comportamento ditatorial, fascista e  medieval que o governo brasileiro vem tomando quanto ao direito de cada cidadão manifestar. Segue essa semana para o Congresso um Projeto de Lei que deverá ser apreciado com rapidez, afinal quem mandou foi a Sra Presidenta, que trata da punição aos manifestantes  que hoje saem às ruas. Pelo que apurei esse projeto de Lei , de autoria do Executivo (leia-se Dilma),   prevê punições severas a quem for preso fazendo manifestação ou, como eles mesmo definem, vandalismo  nas ruas.
Quanto a cobertura jornalística a  Globo, obviamente, justifica sempre as  a agressões policiais , tachando os manifestantes de baderneiros e vândalos. Com ela,  o grosso da imprensa reacionária, tais como a Folha de S.Paulo e Estado de S.Paulo, esta última que teria publicado que “espera-se que [Alckmin] passe das palavras aos atos e determine que a PM aja com o máximo rigor para conter a fúria dos manifestantes, antes que ela tome conta da cidade de São Paulo”. O comportamento da polícia pode deixar  apreensivos outras centenas de milhares da classe média, que descobrem  pela televisão que esse tipo de violência existe. Mas não assusta os  milhões de moradores da periferia, que experimentam desde cedo a truculência da polícia, que – não raro – os trata – como cidadãos de segunda classe..
Essa atitude da Presidenta Dilma  reforça o  pensamento histórico de que na sociedade todos são iguais, mas existem “os mais iguais”.  A anistia Internacional, órgão ligado a ONU que fiscaliza as ações dos governos quanto ao respeito a Declaração Universal dos Direitos do Homem,  já acionou o Brasil por duas oportunidades no Tribunal Internacional de Haia por: desrespeitos aos direitos mínimos da pessoa, policia assassina e inoperância do Estado. É evidente que esse tribunal é muito mais moral que efetivo nas suas decisões, porem, estar na lista de países onde a policia mais mata no  mundo, não é um bom pressagio para que  Dilma radicalize ainda mais, sob pena de ser cúmplice de um genocídio. 


VEJA ABAIXO O EXEMPLO DE COMO A NOSSA
 POLICIA É DESPREPARADA.






 QUANDO CRITICO O APOIO DO PT AO GOVERNO CORRUPTO DE NÍCOLAS  MADURO DA VENEZUELA,  ESSAS CRÍTICAS SÃO EMBASADAS  NO VÍDEO ABAIXO



P.S..Lembro a todos que essa é a minha opinião e respeito as opiniões contrárias, porem tenho subsidios para afirmar o que escrevi acima..


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

SARTRE: A ESSÊNCIA HUMANA NÃO E DEFINÍVEL PORQUE NÃO É NADA.

Alacir Arruda

     Analisando a afirmação acima, proferida pelo filósofo Francês Jean Paul Sartre no seu livro “O Existencialismo é um Humanismo”, concluiremos que ela também serve de base para a fundamentação de que o homem não possui ‘natureza’ ou uma ‘essência’ estática a qual mostre o que ele deve fazer, ou, em outras palavras, um destino já traçado, no qual o que resta ao homem é apenas percorrer o que está predestinado para ele. Ao contrário, o homem é fazer-se, e irá ser aquilo que projetou ser. Na medida em que ele se constrói em seu próprio agir, estará demonstrando sua liberdade, escolhendo aquilo que se projetou a ser. “O homem não é senão o seu projeto, só existe na medida em que se realiza, não é, portanto nada mais do que o conjunto de seus atos, nada mais do que sua vida” (Sartre, 1978, p. 241).
Assim sendo, na filosofia de Sartre a Liberdade é algo que constitui dinamicamente o homem, pois a partir de escolhas o ser se constrói. É no agir, na escolha que o ser humano se revela nitidamente humano. Portanto, para o filósofo, a liberdade não pode vir antes da escolha, mas a partir do momento em que nós escolhemos, demonstramos que somos livres.

1. Liberdade fonte de todos os valores

Para Sartre o homem não possui natureza humana, pois não existe nenhum ser inteligível, como por exemplo, um Deus que possa conceder tal natureza. Não existe nenhum ser necessário que explique o porquê de estarmos no mundo, ou o porquê de nascermos nesta época e não em outra, ou porque tal ação deve ser feita assim e não de outro modo... “Se, por um lado, Deus não existe, não encontramos diante de nós valores ou imposições que nos legitimem o comportamento” (Sartre, 1978, p. 227). Sendo assim, o que resta ao homem é apenas a sua liberdade, a liberdade como fundamento único e legítimo de todos os valores. “Se a liberdade é o valor supremo, o valioso é escolher e agir livremente” (Sanchez, 1995, p. 287).
     Não existe algo preestabelecido que possa nos recomendar a agir desta ou daquela maneira, pois exclusivamente ajo a partir de minha consciência. “Logo, não há qualquer imperativo categórico universalmente válido e logicamente necessário, nenhuma lei ética geral que nos indique como devemos agir ou o que fazer nesta ou naquela situação” (Perdigão, 1995, p. 113). Não encontramos diante de nós nenhuma normatividade a priori, leis ou preceitos divinos que digam o que devemos fazer, mas situações que nos obrigam a escolher. 
    Para filosofia de Sartre, a moral cristã, bem como, as teorias éticas de alguns filósofos carece de sentido. Para o cristianismo Deus é uma premissa necessária para todo o nosso agir. A partir dos preceitos divinos, desta moral, traçamos nossa vida, escolhendo por aquilo que nos orientam fazer, efetuando a distinção entre o que é bom fazer do que é mau. Esta premissa é reguladora, fazendo-nos agir deste modo e não de outro. Em Sartre não há nenhuma moral na qual possamos basear-nos. Não há valores morais pré-estabelecidos, a moral não é fixa, o homem deve criar e inventar, por meio de sua liberdade, sua moral. “O homem faz-se, não está realizado logo de início, faz-se escolhendo a sua moral, e a pressão das circunstâncias é tal que não pode deixar de escolher” (Sartre, 1978, p. 258).
     Sartre parte da afirmação de Dostoiewisky quando este diz: se Deus não existisse, tudo seria permitido[3]. Sendo assim, se justifica que o homem está abandonado no mundo, sendo que, o mesmo não tem em quem se apoiar, pois nada ou ninguém podem mostrar a ele o melhor a fazer. Se Deus não existe[4], o ser do homem está em seu próprio fazer, pois nada o determina, ele é a própria liberdade e está condenado a escolher, a ser livre[5].
     O filósofo,  ainda em seu livro “O Existencialismo é um Humanismo”, nos coloca o exemplo de um dos seus alunos que o procurou para lhe pedir um conselho sobre se deveria ir para a guerra ou ficar com sua mãe. O pai do rapaz sendo colaboracionista abandonou sua esposa e seu irmão mais velho havia sido morto na ofensiva alemã de 1940. O jovem rapaz estava totalmente dividido sobre o que iria decidir. Ao mesmo tempo em que desejava atear vingança contra àqueles que mataram seu irmão, pensava, contudo, em ajudar a sua mãe a viver, já que esta estava sozinha. Sartre, nesta ocasião não emitiu nenhum conselho ao jovem rapaz acerca do que este deveria decidir. Assim ele afirma: 
      Se ele nos vem pedir um conselho, é porque já escolheu a resposta. Praticamente, eu teria podido muito bem dar-lhe um conselho; mas uma vez que ele procurava a liberdade, quis deixá-lo decidir. Sabia de resto o que ele iria fazer, e foi o que fez (Sartre, 1978, p. 304).
      Com isso, Sartre queria dizer que não há uma moral que diga que o rapaz deva ir à guerra ou ficar com sua mãe. Ele deverá escolher e ser responsável por aquilo que decidir. O jovem, levando em conta o seu sentimento, acabou ficando com sua mãe. Dessa forma, notamos que os valores preestabelecidos são vagos, pois no momento em que o rapaz escolheu ficar com sua mãe, não levou em conta nenhuma moral, mas seu sentimento com relação a ela, pois no fundo o que conta é o sentimento. Mas, se ele sentisse que seu amor à mãe não era o bastante, então iria à guerra vingar seu irmão[6]. 
     Diante disso, na filosofia existencialista de Sartre, encontramos um homem que se constrói mediante as escolhas efetuadas, baseando-se não em um ser necessário ao qual diga que a escolha que fizer é melhor do que a outra. Por isso, o ser do homem está em suas mãos[7], pois ele sendo livre, tem que fazer seu ser, sua existência. Tem que optar por uma possibilidade, no entanto, há várias, e cada escolha que fizermos assumimos responsabilidades, por nós e pelos demais. Sartre nos diz: “Assim sou responsável por mim e por todos, e crio uma certa imagem do homem por mim escolhida; escolhendo-me, escolho o homem” (Sartre, 1978, p. 220).
     O homem encontra-se desamparado, abandonado, lançado ao mundo e não tem outra opção senão a de escolher, sendo responsável por tudo aquilo que faz. Nesta situação, Sartre declara o homem como sendo “angustia”:
       Assim, consideramos finalmente que a filosofia da liberdade de Sartre se resume em seu próprio dito: “o destino do homem está nas suas mãos” (Sartre, 1978, p. 246). Isto significa que o homem será o que tiver se projetado, porque o homem é liberdade. É forçado, em face a situações, a escolher, a inventar-se a cada momento sendo responsável pelas suas escolhas, sempre em vista dos outros. Não obstante, a única coisa que não pode escolher é de não ser livre, pois nisto implicaria a renuncia de si mesmo. Sua liberdade é o fundamento de toda a moral, porém nada justifica que este ou aquele valor seja melhor. Se a liberdade do homem é o fundamento absoluto, então, a moral não existe senão no próprio homem, manifesta no agir concretamente.



[3] Cf. Sartre, 1978, p. 227.  
[4] Sartre afirma que o problema da liberdade não é se Deus existe ou não, mas o que é necessário é que o próprio homem se reencontre em si mesmo pela ação. “O existencialismo não é de modo algum um ateísmo no sentido de que se esforça por demonstrar que Deus não existe. Ele declara antes: ainda que Deus existisse, em nada alteraria a questão; esse o nosso ponto de vista. Não que acreditemos que Deus exista; pensamos antes que o problema não está aí, no da sua existência: é necessário que o homem reencontre a si próprio e se persuada de que nada pode salva-lo de si mesmo, nem mesmo uma prova válida da existência de Deus” (Ibid., p. 270). 
[6] Cf. Sartre, 1978, p. 232-233. 
[7] Cf. Ibid., p. 246.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

PARA REFLEXÃO

Schopenhauer e a Metafísica consoladora da morte.
Alacir Arruda
Muitos filósofos desenvolveram teorias próprias em relação a morte, mas nenhum discorda que esse é o destino final de todo ser vivente e por isso, fonte de todas as nossas angústia, pois sabemos que estamos a caminho dela. A morte sempre foi a musa inspiradora da filosofia e por isso Sócrates diz que a filosofia é a “preparação para a morte”. Estranha idéia, mas verdadeira, essa de que se não morrêssemos não filosofaríamos. Pode-se acrescentar a essa verdade tantas outras, tais como: se não sofrêssemos não filosofaríamos; se não amássemos não filosofaríamos; se não admirássemos não filosofaríamos; se não nos espantássemos não filosofaríamos, etc. Schopenhauer nos diz, contudo, que a morte é a musa inspiradora da filosofia e sem ela seria difícil que se tivesse filosofado. É por conta disso que o filósofo não pode prescindir de a morte falar. E Schopenhauer o faz desde a perspectiva geral da sua filosofia, ou seja, desde a relação com a indestrutibilidade do nosso ser-em-si. É desde esse horizonte que a filosofia de Schopenhauer será uma metafísica consoladora diante da certeza da morte. 

É no horizonte da metafísica da vontade que Schopenhauer irá transformar a consolação teológica da morte para uma consolação propriamente filosófica. E para isso se valerá da oposição entre a imortalidade da espécie e a mortalidade do indivíduo. O indivíduo morre, mas será imortal na espécie. O mundo é vontade e a vida é uma manifestação sua. A vida é a vida da espécie e o indivíduo é apenas um exemplar, uma amostra da própria espécie. Não é no indivíduo que a natureza e a vontade se interessa. Para este a natureza é completamente indiferente, a sua vida e a sua morte não o comovem (Schopenhauer, 2004, p.35). Para a natureza o que conta é a espécie e essa não morre. A morte do indivíduo é a morte da aparência e não da vontade em si, eterna na idéia da espécie. Por isso, quem vê além das aparências, em nada haverá de temer a morte, pois na imortalidade da natureza a individualidade deveria se enxergar e se consolar. Diz Schopenhauer: 

Ora, o homem é a natureza, a natureza no mais alto grau da consciência de si mesma; se, portanto, a natureza é apenas o aspecto objetivo da vontade de viver, o homem, uma vez bem convencido disso, pode com razão sentir-se consolado completamente com a sua morte e a dos seus amigos: só tem que dar uma olhada para a natureza imortal: esta natureza, no fundo, é ele. O que é no fim das contas a vida? Um fluxo perpétuo da matéria através de uma forma que permanece invariável: do mesmo modo o indivíduo morre e a espécie não morre (Schopenhauer, 2001, 290- 291). 

Fica claro na posição de Schopenhauer que a espécie representa o que para Platão representa a Idéia na relação com o individuo do mundo sensível. O mundo sensível, formado de indivíduos, participa do mundo da Idéia. Como o mundo das Idéias é eterno, o mundo sensível terá a sua eternidade na participação com o mundo ideal. Da mesma forma o indivíduo (João, Maria, José, etc.) morre, mas não morrerá a espécie humana e muito menos morrerá a vontade de viver da natureza que sempre de novo se reproduzirá e se eternizará nas espécies. Eis aí o consolo do homem diante do medo da morte. Não há porque temer a morte, afinal seremos eternos na natureza. Aliás, querer ser eterno individualmente é um contra senso. Se a vida é um fluxo perpétuo da matéria de uma forma que permanece eterna, então, entre a alimentação e a geração, por um lado, e as perdas de substâncias e a morte, por outro, há apenas uma diferença de grau. Isso significa que se nós não ficamos horrorizados pelas excreções e até somos indiferentes a sua perda, seria absurdo querer reter perpetuamente a nossa existência individual quando ela deve ser continuada por outros indivíduos. Assim, embalsamar cadáveres é tão absurdo quanto prestar culto a cada vez que nosso corpo se desfaz dos resíduos indesejados. 

Na linha argumentativa de que a natureza se desinteressa pela vida do indivíduo, pelo fato de que a destruição de um tal fenômeno não afeta em nada a sua essência, Schopenhauer considera um absurdo a tese de que a vida é um aparecimento a partir do nada e mesmo assim terá uma continuidade individual eterna. Se não consideramos a vida de um elefante, de um macaco ou um cão com existência individual continuada, após o hiato da vida fenomênica, então como explicar que a vida do homem, supostamente também vinda do nada, permanecerá em sua individualidade e consciência eternamente? Não há como explicar, pois é um absurdo. O certo, diz Schopenhauer, é pensar a natureza não linearmente, tendo um começo do nada e um prolongamento infinito. O certo é pensar a natureza sob o símbolo do círculo, porque ele é o esquema do retorno. E o símbolo do retorno sinaliza a eternidade da natureza, aquilo que Schopenhauer denomina como palingenesia, ou o eterno retorno dos genes, pouco importando a efemeridade dos entes individuais, sejam humanos ou não. Diz Schopenhauer: 

Contemplai no outono o pequeno mundo dos insetos: vereis como um prepara seu leito para dormir o longo e letárgico sono do inverno; o outro tece seu casulo para passar o inverno sob a forma de crisálida e despertar um dia, na primavera, mais perfeito e mais jovem; a maioria, enfim, que tenciona repousar no braço da morte, se inquieta para preparar um abrigo adequado para o seu ovo, de onde, um dia, ressurgirá sob uma forma nova. Que é isso senão a grande doutrina de imortalidade da natureza, que gostaria de nos ensinar que entre sono e morte não há diferença radical, mas que uma não é para a existência um perigo maior do que o outro? (Schopenhauer, 2004, p.39).

O mesmo acontece com o humano, posto que também é natureza. Não perceber a imortalidade na transformação da própria natureza é estar preso ao conhecimento fenomênico, e não da coisa-em-si. Desde a perspectiva da coisa-em-si a morte é uma ilusão, pois a morte para a natureza e para a espécie é como o sono para o indivíduo, ou o piscar das pálpebras, ambos não afetam o verdadeiro ser. E é na espécie, objetivação mais imediata da coisa-em-si, que a vida e a vontade de vida não cessam. Alguém poderia perguntar: mas e a consciência individual, o que comumente se chama alma, não é eterna? Schopenhauer responde: a consciência, o eu, nada mais é do que uma atividade cerebral, portanto, produto do orgânico e, como tal, começa e termina com ele. O corpo individual morre e é destruído e com ele a consciência, só não é destruída a vontade, da qual o corpo é obra. A distinção entre vontade e conhecimento, com a primazia da primeira, eis a filosofia de Schopenhauer. Erraram todos os filósofos, diz Schopenhauer, em “pôr no intelecto o princípio metafísico, indestrutível e eterno do homem: ele está exclusivamente na vontade, que é completamente diferente do intelecto” (Schopenhauer, 2004, p. 60). O que seja esse princípio imperecível não se pode explicar, diz Schopenhauer. Não é nem a consciência e muito menos o corpo sobre o qual repousa a consciência. “É, antes, o fundo sobre o qual repousa o corpo e a consciência junto com ele” (Schopenhauer, 2004, p. 60). 

Contudo, a morte é percebida para o indivíduo como o maior dos males e seu temor afeta tanto o homem quanto o animal. E se afeta tanto o ser humano quanto ao animal, então é porque o medo da morte não depende do conhecimento. O medo da morte é intrínseco à vontade de viver e ao apego ilimitado à vida, fundo comum de todo ser vivente. O apego ilimitado à vida, o querer viver, a vontade de vida e, por conseqüência, o medo da morte, são completamente irracionais. O medo da morte não pode vir do conhecimento e da reflexão. O conhecimento, diz Schopenhauer, atua como antídoto ao medo da morte revelando o pouco valor da vida. Assim, “quando prevalece o conhecimento o homem avança ao encontro da morte com o coração firme e tranqüilo, e daí honramos sua conduta como grandiosa e nobre; celebramos então o triunfo do conhecimento sobre a vontade de vida cega” (Schopenhauer, 2004, p. 26). Na proporção inversa desprezamos o homem que se apega sem reservas à vida.



segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

estudar para ENEM

RACISMO INSTITUCIONAL: ATÉ QUANDO?
Alacir Arruda 

    O Brasil assistiu nos últimos dias a cenas lamentáveis da prática de Racismo que são inaceitáveis numa sociedade que se julga minimamente “civilizada”. O que mais me preocupa é a omissão do Estado diante desse tema, uma vez que  na visão do  governo, a simples criação de cotas para negros em universidades, a inclusão dessa etnia em programas de transferência renda e algumas ações afirmativas no campo profissional,   resolveria uma questão  complexa  que envolve fatores históricos e  uma demanda reprimida de, no mínimo, 300 anos.
       O primeiro caso trata-se do jogador de futebol do Cruzeiro Esporte Clube de MG “Tinga” que foi achincalhado no Peru toda vez que pegava na bola pela torcida peruana em jogo da Copa Libertadores da America. Os torcedores imitavam o barulho de macaco quando jogador brasileiro tocava na bola, além de ter sofrido outras ofensas verbais à beira do campo. O Presidente do Cruzeiro solicitou a Confederação Sul americana de Futebol, que organiza o campeonato, que abra um procedimento investigatório sobre o caso e pede ainda a exclusão do clube peruano da competição.
      O segundo caso ocorreu em Brasília quando uma cliente branca, australiana, procurou um salão de beleza daquela cidade para fazer as unhas, quando a proprietária disse para ela sentar-se que a manicure já estava à espera, ao deparar com uma profissional negra ela se recusou a ser atendida o que causou revolta de todos que assistiram a cena. A australiana foi levada ate a delegacia onde foi acusada de pratica de racismo, pagou fiança e deverá responder o processo em liberdade.
     Os casos acima nos leva a uma breve reflexão sobre essa pratica, abominável sob qualquer aspecto, do comportamento humano. No Brasil o racismo é institucional, e hoje ele é praticado de norte a sul do Brasil e isso só ocorre quando uma sociedade internaliza a produção de desigualdades nas suas instituições. Nossa história é marcada pelas formas como o Estado e todas as estruturas estratégicas na formação da sociedade brasileira atuaram de forma diferenciada – e nociva – em relação às populações e comunidades negras em função de suas características físicas e culturais. Se historicamente, a conseqüência do racismo institucional nas ações do Estado, por exemplo – com as políticas públicas, no caso do Poder Executivo – é a sua absorção de forma diferenciada por esses grupos, por outro lado, a maior conseqüência tem sido a definição do lugar (ou não lugar) do negro na sociedade brasileira.
   Existe hoje em discussão O Programa de Combate ao Racismo Institucional (PCRI) que define  a político-programática. “A primeira diz respeito às relações que se estabelecem entre dirigentes e trabalhadores (as), entre os (as) próprios (as) trabalhadores (as) e entre estes (as) e os (as) usuários (as) dos serviços”.
   A segunda dimensão – político programática – pode ser caracterizada pela: a) compreensão de que as políticas universilizantes não compreendem e não atendem as especificidades culturais, sociais, étnicas e raciais de pessoas e grupos atendidos por organismos e políticas, ao contrário, suas diferenças são usadas para reforçar a desigualdade; b) pelo reconhecimento do racismo como determinante das desigualdades que engessam as potencialidades individuais; c) pela inclusão da cor como dado de identidade individual e coletiva a ser considerado em estudos sobre relações sociais, direitos e privilégios, e também no diagnóstico de realidades sociais passam a ser importante indicador da existência de desigualdades sócio-raciais; d) pelo investimento – ou falta dele – em ações e programas que identifiquem práticas discriminatórias e suas conseqüências; pela elaboração e implementação de mecanismos e estratégias de não discriminação, combate e prevenção do racismo e intolerâncias correlatas, a começar pelos gestores e profissionais que atuam numa relação direta com o público; e) pelo compromisso em priorizar ações e estratégias de redução das assimetrias e promoção da equidade.
     O racismo é institucionalizado, pois está presente na ação dos agentes de organizações púbicas e privadas, às vezes, pode ser naturalizado e tornado invisível. Mas é institucionalizado também porque não são as instituições que o criam, elas são vetores de reprodução de um sistema racista. Sendo o racismo anterior às instituições, nelas ele encontra força eficiente, pois são nas normativas e dinâmicas institucionais que se definem quem participa do sistema, quem é reconhecidamente cidadão, quem tem direito e a que cada um (ou grupo) terá acesso.
     Questionar o racismo só tem sentido se for “a partir das suas instituições e do sistema que produz as instituições” (2011, p. 84). Ou seja, começamos a vislumbrar um processo de atingirmos as raízes do racismo que provocará mudanças estruturais rumo a uma “democracia pluralista”. n

domingo, 16 de fevereiro de 2014

AOS ALUNOS DE PSICOLOGIA

Sigmund Freud e a  Religião.

Por. Alacir Arruda

– Freud, psicanalista austríaco,  é considerado um dos maiores nomes da ciência no século XX. Em seus vários inscritos, manteve sempre uma postura racional na avaliação do homem e sua relação com os fenômenos sociais, dentre eles a Religião. Em seu livro: O Mal-Estar na Civilização Freud descreve sua teoria sobre a religião e a moral. Em linhas gerais, ambas representam, para Freud, uma repressão sobre as pulsões humanas, tanto as de vida quanto as de morte, na medida em que pregam valores sobre-humanos como os de modéstia, caridade, solidariedade, paz, todos valores que supostamente se realizariam numa época vindoura e extra-terrena, mas que já poderiam começar a ser realizadas na vida terrena. Mas esses valores são anti-humanos porque supõem, segundo Freud, a repressão dos instintos mais básicos, que são sempre egoístas.

– No item I do livro, Freud destaca a idéia de sentimento oceânico – levantada por seu amigo Romain Rolland, colocando-a sob a crítica da psicanálise. Freud introduz o texto com um breve questionamento dos valores sociais. Afirma que há duas ordens de pessoas admiráveis, aquelas que admiramos mas que não queremos imitar, e aquelas que admiramos e queremos imitar. A primeira diz respeito às pessoas cujos valores são os de caráter ético; essas pessoas são admiráveis, mas ninguém quer imitá-las. A segunda diz respeito às pessoas cujos valores são o poder, o sucesso e a riqueza; essas pessoas são admiráveis, e todos querem imitá-las. Freud considera seu amigo Rolland como uma pessoa da primeira ordem; um ser excepcional. Mas Freud quer questionar seus princípios (valores), o que significa igualmente questionar sua própria pessoa.

 – Freud tinha enviado a Rolland um livro expressando sua opinião sobre a religião: a religião é uma ilusão. Rolland, que era religioso, afirmara não ter Freud compreendido a verdadeira fonte da religião, uma espécie de sensação de eternidade, um sentimento de algo ilimitado, sem fronteiras – oceânico, por assim dizer (p. 81)A religião seria, para Rolland, apenas um expediente de expressão deste sentimento profundo, um sentimento de divindade que o ser humano sente em face de sua pequenez. Poder-se-ia aniquilar a religião que o sentimento permaneceria no íntimo do ser humano.

– O questionamento de Freud é simples; representa o paradigma do questionamento psicanalítico da religião. Freud afirma que ego maduro designa algo autônomo e unitário, distintamente demarcado de tudo o mais (p. 83)No entanto, este ego, no início de sua vida, ainda no recém-nascido, não era precisamente demarcado, isto é, o bebê ainda não se percebia como diferente do mundo e o mundo como diferente de si. Ambos, bebê e mundo mantinham uma unidade. Isso ocorre sobretudo na vida uterina, onde há unidade entre o bebê e seu ambiente.

-No entanto, há interrupções nesta relação. A separação entre bebê e o útero é a primeira interrupção, a separação entre o bebê e o seio da mãe também. O bebê passa a se sentir desamparado com essas interrupções e sonha com a unidade perdida. O ego maduro ainda conserva, inconscientemente (mente inconsciente), memórias deste elo perdido com o ambiente e, via de regra, regride a estágios anteriores da infância em busca dele. Ora, este sentimento oceânico (que Freud diz não encontrar em si mesmo, mas que admite existir na maioria dos seres humanos), representa, para Freud e a psicanálise, uma expressão do elo perdido com o universo, com algo maior, mais perfeito, preenchedor, poder-se-ia dizer.

 – Em suma, tanto a religião quanto a suposta fonte inspiradora da mesma são, para Freud, apenas funções de uma mente cindida entre um ego autônomo e um ego ainda retido nas relações com o mundo externo, quer dizer, funções de uma mente psiconeurótica: a origem da atitude religiosa pode ser remontada, em linhas muito claras, até o sentimento de desamparo infantil (p. 90).

– Logo, os verdadeiros valores sociais são aqueles do segundo tipo de pessoa, expressão do nosso egoísmo natural, o que põe por terra todos os valores ético-religiosos.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

TEMA QUE SERA EXPLORADO PELO ENEM 2014

Ucrânia: a cronologia de uma tragédia anunciada.
Alacir Arruda
Violência e gangsterismo marcam ação do governo e manifestantes ucranianos. Agora, todos os possíveis desfechos parecem negativos
Ainda não sabemos quem são os roteiristas, mas analisando o drama, podemos ver suas diferentes etapas:
1. Em 28 de novembro o presidente da Ucrânia, Vítor Yanukovich, decide postergar a assinatura do acordo de associação com a União Européia, pelas perdas econômicas que implicaria na relação com a Rússia.
2. A oposição convoca um protesto na Praça da Independência. Em 30 de novembro, a polícia reprime centenas de manifestantes e desocupa a praça. Fica um mal-estar e decepção na sociedade, mas não mais que isso.
3. Na noite de 30 de novembro, quando os protestos dos partidários da integração da Ucrânia à Comunidade Européia perdiam intensidade, as forças especiais da polícia, de forma surpreendente, atacam um grupo de estudantes, surrando-os selvagemente. A TV mostra as imagens a todo o país, a oposição imediatamente faz um chamado ao povo e no dia seguinte, para surpresa de todos, saem um milhão de pessoas à rua em Kiev, uma cidade de 3 milhões de habitantes.
4. No dia seguinte, 1º de dezembro, um grupo de radicais falando russo (a grande maioria dos ativistas fala ucraniano) ataca com paus e correntes um grupo de alunos da escola militar e da polícia antidistúrbios. Os atacantes tratam de enredar os civis que protestavam pacificamente nos seus atos de agressão. Os policiais presenciam a situação mais de uma hora e meia sem receber ordens para reprimir, e quando ela chega, reprimem brutalmente. A maioria das vítimas é de civis inocentes. Dezenas de outros inocentes são presos. A TV russa filma tudo e imediatamente as imagens vão ao ar nos canais controlados pela oposição ucraniana. Resultado: o povo chega à Praça da Independência, se instala em barracas e cerca os tribunais de justiça. As forças policiais já pareciam seguras de que todos os manifestantes eram extremistas, e atacam prontamente, enquanto os demais já não duvidam que os policiais antidistúrbios são carrascos sanguinários, provavelmente mercenários russos vestidos como policiais ucranianos.
5. Em 11 de dezembro, quando a tensão baixa gradativamente, organizam-se “mesas redondas”, chegam muitos emissários europeus oferecendo intermediação e parece que todos estão a ponto de chegar a um acordo. A polícia ucraniana, sem maior entusiasmo, realiza uma tentativa de desocupar a Praça da Independência, e o faz com bastante cautela e sem atacar ninguém. Em resposta, por toda a cidade tocam os sinos das igrejas e o povo sai de casa às duas horas de uma madrugada gelada para defender a praça. O transporte público já não funcionava, e os taxistas levam as pessoas ao centro gratuitamente. Ao final, o povo, que já estava perdendo o entusiasmo inicial, se anima novamente e constrói barricadas de três metros. Os chefes policiais ficam incomodados porque não receberam ordens para reprimir.
6: Passa quase um mês. O Presidente Yanukovich viaja a Moscou e recebe de Putin a promessa de um crédito de 15 bilhões de dólares. Passadas as festas de Ano Novo, o povo está cansado, e na Praça nota-se uma certa desilusão e esgotamento. De repente, em 16 de janeiro, o parlamento ucraniano, violando todas as normas, aprova as chamadas “Leis da Ditadura”, que proíbem de forma estrita todas as manifestações públicas. O povo recebe a notícia e não pode acreditar. Todos novamente se despejam nas praças e no centro da cidade. A oposição política se vê cada vez mais passiva e indecisa.
Em 19 de janeiro, os mesmos jovens que foram os provocadores do 1º de dezembro (a mesma idade, os mesmos refrões e os mesmos métodos) atacam absurdamente, num domingo, o Palácio do Governo vazio, e com muita violência agridem novamente a polícia e as tropas especiais. O povo, exausto com a passividade da oposição política, cai na provocação e também participa, lançando coquetéis molotov nos representantes do poder. Começam os combates de rua, o resultado: 40 policiais e militares e centenas de civis feridos. O governo determina o uso de carros lança-água contra a multidão, mesmo com uma temperatura de 5oC abaixo de zero. Um dos líderes da oposição, o boxeador Vitali Klichko, tenta se reunir com o Presidente, que trata de ganhar tempo e não o recebe. Os ódios de ambos os lados crescem.
7. A partir desse momento, aparecem maciçamente nas ruas jovens musculosos, muitos deles com passado delitivo, contratados pelo governo para amedrontar os manifestantes. Os ativistas radicais começam a caçá-los, levando alguns deles à Praça da Independência para surrá-los, ainda que sem maior selvageria, mostrando-os à imprensa. No dia 22 de janeiro, Dia da União da Ucrânia, novo feriado do país, franco-atiradores desconhecidos matam cinco pessoas. Todos os disparos foram feitos por profissionais, diretamente no coração ou na cabeça das vítimas. Carros sem placa começam a sequestrar ativistas e transeuntes casuais, suspeitos de simpatizar com Maidan. Torturam selvagemente dezenas destas pessoas, as desnudam e as atiram na neve. Também queimam os carros de muitos ativistas. Os canais de televisão controlados pela oposição mostram os mortos e a brutalidade policial. Pela Internet, todo o país vê um vídeo que começa a circular, em que policiais, depois de torturar, desnudam na neve um ativista e, em seguida, tiram fotos com ele. Matam um conhecido líder social, doutor em ciências…
-Uma frase escrita no muro da sede do governo em Kiev (capital da Ucrânia)  é a síntese desse conflito:

“Alguém invisível parece muito interessado em dividir-nos e enfrentar-nos…”