terça-feira, 18 de agosto de 2015

escola da ponte: modelo de educação

Escola da Ponte modelo de educação moderna e a reinvenção da escola 
Por Alacir Arruda

 
Professor Jose Pacheco  fundador da Escola da Ponte 


Todos sabem que sou um critico ácido da educação hoje praticada no Brasil, pois não tenho a menor dúvida que as escolas brasileiras prestam um desserviço ao que se entende por educação como elemento transformador. Sou adepto da seguinte máxima: “ dentre as várias atribuições do professor no Brasil, a mais inútil é a aula”. A que aula me refiro? A essa aula conteudista, bancária, aquela que já vem pronta e o professor a injeta na cabeça do aluno como se este fosse dividido em compartimentos, essa aula maçante que faz com que 75% dos alunos simplesmente a ignorem, aulas que não traduzem a realidade do educando e sim atende a interesses corporativos e institucionais onde a lógica se justifica no lucro. 

Bom, peço licença para falar de algo sério, algo que transcende as experiências “idiotas” do estado brasileiro. Em Portugal, mais precisamente em Vila das Aves, a cerca de 30 km da cidade do Porto, localiza-se uma curiosa escola: a Escola da Ponte. Para quem nunca ouviu falar, vale um pequeno resumo de sua história. A Escolada Ponte é uma escola pública que sempre recebeu alunos muito “problemáticos”. Com resultados desastrosos, José Pacheco, o diretor, resolve repensá-la e em 1976 inicia-se o processo de autonomia curricular que é a marca da escola (ela é a única no mundo que alcançou este marco). A partir daí, mudanças ditas como impossíveis aconteceram e uma série de fatores levou a Escola da Ponte a se tornar referência, incluindo os resultados alcançados por seus alunos, que estão entre os melhores do país. 

“Meus alunos serem os melhores é um desgosto para mim”, afirma José Pacheco, ou simplesmente Zé da Ponte, como é conhecido. “Com uns sendo os melhores, outros têm de ser os piores. Todos deveriam ser os melhores.”

Um homem altamente cordial, Zé Pacheco faz uso de pensamentos de muitos teóricos e afirma que no Brasil ele encontrou os melhores. Tal fato o incentivou a morar aqui, pois, para ele, os professores brasileiros são os mais preocupados em mudar a situação pela qual passa a Educação. Atualmente, vive em Belo Horizonte, Minas Gerais, e acha necessário seu afastamento da Escola da Ponte depois de 35 anos envolvido com ela. “Ela pode seguir seus passos sem mim.” O projeto educacional da Escola da Ponte está sendo trazido para o Rio de Janeiro, mas ele ainda não pode revelar o nome de seus novos parceiros. 

Zé Pacheco, falando sobre suas histórias, que se entrelaçam com as da escola que ajudou a construir, costuma referir-se a ela como “minha escolinha” e quando os alunos são mencionados, muitas vezes figuram como “os miúdos”. Esse carinho não é por acaso. Zé defende o professor como um trabalhador solidário e não solitário e prega uma cultura de cooperação entre todos que fazem parte da escola. 

Educação estrábica
Perguntado sobre como ele vê a educação, Zé responde de maneira extremamente bem-humorada. “Eu a vejo de modo estrábico, como já devem ter percebido.” Ele possui um grau de estrabismo bem acentuado. Deixando as brincadeiras de lado, ele trata da Educação com muita seriedade e utiliza frases bem fortes para descrevê-la. “Nós existimos com os outros e tudo está focado na relação. A educação não se encontra somente dentro da escola.” Essa relação envolve desde os auxiliares da escola até as famílias dos alunos, que são grandes incentivadores da metodologia proposta pela escola. O educador acredita que esta parceria garante a sobrevivência da escola perante a “caça” que a Ponte sofre por parte do estado português: “Não conseguirão de jeito algum fechar aquela praga!”

A idéia de renovar a educação veio de modo simples, diz Pacheco. “Tudo começou com perguntas. Trabalhamos com a ideologia mesmo. Para começar uma mudança, é preciso apenas um pequeno grupo e o que estava errado era o modo de ensinar e não o de aprender.” Ele ainda diz que as escolas de hoje (muito iguais às de 200 anos atrás) constroem o sentimento de competição e concorrência. No fim, ele questiona se esse é o verdadeiro progresso. 

A Escola da Ponte está diretamente ligada à pedagogia libertária, que segue a tendência da educação como transformadora e criadora da autonomia. Lá, o mais importante é o que vem do aluno, algo que tem a ver com a autoformação através da politécnica da aprendizagem, sistema por ele defendido. 

Para se entender um pouco melhor a Escola da Ponte, é necessário perguntar-se não o que ela tem, mas sim o contrário: ela não tem diretor, aulas, horários, séries, grupos etários, presença de ponto, provas, notas, enfim, comparando-a com a escola tradicional, ela possui praticamente só o mesmo espaço físico em comum. Sobre essas “ausências”, Pacheco diz que com um tempo as pessoas conseguem entender as propostas ali defendidas (e é assim que o trabalho consegue ser efetivado) e alerta que precisou dar muita, mas muita aula para ver que aula não presta para coisa alguma. Ratificando sua opinião, ele responde que a única coisa a ser feita para deixar a sala de aula mais interessante é implodi-la. 

Muitos questionamentos surgem depois de todas essas informações: “Como são as ‘aulas’ lá?” “O que faz o professor?” “Quem comanda tudo isso?”. Resumidamente, é tudo muito simples. Todo mundo faz tudo, juntos. Os alunos vão às ‘aulas’ (que são uma espécie de oficina) que querem e ficam o tempo que querem. Se acharem por bem, voltam depois, ou não. Os professores apresentam essas oficinas (muitas vezes, propostas pelos próprios alunos) e sua função é mais de indagar do que esclarecer. Quando questionado sobre algo, ele sempre procura a resposta no aluno – ao invés de responder diretamente, ele indaga sobre a opinião do aluno e o porquê dela. Quanto ao comando, todos participam efetivamente. Todos os professores são diretores (querendo ou não!) e os alunos fazem assembléias constantes para definirem os direitos e deveres de cada um dentro da escola, o que permanece e o que precisa mudar. 

Nenhum prazer
Pensando de maneira simples, como gosta de fazer o Zé da Ponte, as escolas de hoje são lugares onde nem o aluno nem o professor sentem nenhum prazer de estar, logo, é óbvio que algo não anda muito certo. A Escola da Ponte tenta e consegue acabar com isso. Não é um mero reparo na escola, mas sim a sua reinvenção. 

Zé Pacheco, por fim, afirma que, hoje, a escola em sua forma tradicional é um mal necessário e diz que num lugar onde há hierarquia é impossível a existência de uma autonomia. Diz também que nem só de vitórias vive a Escola da Ponte e ele próprio está para lançar um livro falando do lado negativo da escola. Zé não acredita em modelos, mas sim em exemplos que podem dar certo, como é o caso da Ponte. “Não consumimos, produzimos currículos.”

Com uma humildade ímpar, José Pacheco divide o mérito com todos e se diz mais um no processo de formação da Escola da Ponte. Ressalta ainda que tudo que a Ponte fez já tinha sido dito e tentado por outros teóricos que muitas vezes não são minimamente conhecidos e, sendo assim, não são lembrados por tal triunfo. “Não foi nenhuma invenção minha. Isso tudo já foi pensado no começo do século passado.” Exatamente por esse motivo, ele exclama: “Eu sou muitos. Eu sou ‘nós’!”

Para muitos que pensam ser impossível tudo isso que foi aqui apresentado, que isso não passa de uma mera utopia, vale lembrar que utópico é algo ideal, mas ao mesmo tempo irreal, imaginário. A Escola da Ponte existe e quem dera se existissem outras com o mesmo propósito!


quarta-feira, 12 de agosto de 2015

o Enem e o embuste das escolas privadas

ESCOLAS FICTÍCIAS: ALUNOS REAIS

Por Alacir Arruda

Alguns podem até achar que pego muito no pé das escolas privadas do Brasil, mas falo com propriedade são 21 anos de sala de aula,  sendo 18 somente em escolas  privadas de renome nacional. Portanto, eu sempre soube das “falcatruas” realizadas por essas instituições para melhorarem seus índices no ENEM, os grandes grupos que trabalhei em SP já faziam isso em 2010, mas a “cara de pau” dessas escolas superou até o mais otimista dos críticos. 

O Resultado por escola do ENEM 2014 revela que aumentou a prática, entre as escolas particulares, de separar os alunos em unidades e/ou CNPJ’s diferentes para parecerem ser melhores do que realmente são.

Das 10 escolas com maior média no ENEM 2014, 8 delas são escolas de muitos alunos, só que a que aparece nos primeiros lugares do ENEM é uma escola com menos de 60 ou menos de 30 alunos. As escolas maiores, de mesmo nome, na mesma cidade ou até no mesmo endereço, também aparecem no resultado. Porém, se ranqueadas, estão em posições muito distantes das primeiras colocadas e com resultados, em geral, muito ruins se comparados aos das primeiras colocações.

A prática de ‘inventar’ escolas, para aparecer entre as primeiras colocadas no ENEM, é feita por motivos publicitários. O objetivo é usar essa informação nas suas propagandas para que consigam captar mais alunos ou, em alguns casos, para que vendam com mais facilidade seus materiais didáticos.

Algumas dessas escolas nunca participaram do ENEM. Explico: foram criadas há poucos anos, somente para aparecer entre as primeiras colocadas. A metodologia utilizada por essas oito escolas é padrão: com centenas e centenas de alunos, elas escolhem os que mais pontuam em simulados internos e os transferem para a escola ou o CNPJ escolhido para servir como instrumento de publicidade.

Também utilizam de sistemas de captação de alunos com alta performance em simulados e que estão matriculados em outras escolas, inclusive de outras cidades. Boa parte desses alunos, captados durante o ensino médio, são bolsistas parciais ou integrais destas escolas. Não pagam, ou pagam muito menos do que os outros, não necessariamente pelo mérito de acertar mais questões, ou por necessidade socioeconômica, mas pelo simples motivo de que são ‘usados’ para os interesses financeiros destas instituições. Algum interesse pedagógico? Não, nenhum.

Os alunos, que vieram desse modelo de captação, não foram formados por essas escolas durante todo o percurso escolar. Ficam pouco tempo nelas, geralmente somente os últimos anos do ensino médio ou somente durante o ensino médio.

Quando fazem propaganda de estar nos primeiros lugares no ENEM, tais instituições passam a impressão de que qualquer pai pode procurá-los e conseguir matricular seus filhos. Não é o que acontece. Se hoje um pai procurar essa escola, terá seu filho encaminhado para as unidades em que os alunos pontuam bem menos dos que aqueles que foram ‘usados’ para a publicidade da escola.

Novamente, no resultado do Exame de 2014, o primeiro colocado nacional é o Colégio Integrado Objetivo, de São Paulo, que funciona no mesmo endereço do Colégio Objetivo, na Avenida Paulista. No ano anterior a escola ocupava, ao mesmo tempo, o lugar 1 e o lugar 569 da lista, depois de ranqueadas todas as escolas do Brasil que tiveram mais de 10 alunos do terceiro ano prestando o ENEM.(http://educacao.estadao.com.br/blogs/mateus-prado/campea-do-enem-e-ao-mesmo-tempo-a-escola-1-e-a-escola-569-do-brasil/).

Um destaque do ano é a cidade de Fortaleza. Três escolas da cidade apareceram, em 2014, entre as 10 primeiras colocadas do ENEM. Duas delas já separavam alunos, o que já estava indicado nos dados dos anos anteriores, e uma passou a separar há pouco tempo, aparecendo pela primeira vez entre as primeiras. As escolas de Fortaleza parecem ter ‘aprimorado’ as suas formas de selecionar alunos para aparecer entre as primeiras colocadas, e passaram a ser as primeiras do Nordeste, resultado que tradicionalmente era do Dom Barreto, de Teresina.

Os dados de Fortaleza refletem a situação do mercado local, onde três escolas, todas muito grandes, disputam de forma bastante agressiva o mercado de alunos de alta renda. Duas delas possuem Sistema de Ensino que vendem para outras escolas, principalmente do Norte e Nordeste, e que receberam grandes aportes financeiros nos últimos anos.

Outro destaque são duas escolas, uma do Rio de Janeiro e outra de Minas Gerais, que pertencem ao mesmo fundo investidor e à mesma empresa (Fundo Gera, empresa ELEVA). Há dois anos, essas duas escolas eram desconhecidas nacionalmente. No ano de 2013 a escola do Rio de Janeiro, pertencente a este grupo, chegou a ocupar (ao mesmo tempo) o lugar 3 e o lugar 2015 entre as escolas que tiveram mais de 10 alunos do terceiro ano fazendo a avaliação. O controlador do grupo Gera é o megainvestidor Jorge Paulo Lemann. Além de um dos homens mais ricos do Brasil, Lemann é conhecido por ser assíduo doador de dinheiro para projetos educacionais (através da Fundação Lemann).

Em Goiás também há uma escola que, para aparecer entre as primeiras colocadas, matricula os alunos que costumam ter maior rendimento em simulados na sua unidade de ensino fundamental (os demais ficam na unidade do ensino médio).

As duas que aparecem entre as dez primeiras e não utilizam esse padrão (de ‘inventar escolas’) são do estado de Minas Gerais. As duas possuem alunos oriundos de famílias de alta renda (quando cruzamos os dados de todas as provas do ENEM, até hoje, renda é a principal influência nas notas da avaliação. Em média, alunos de maior renda conseguem notas superiores aos alunos de menor renda). Não é demais citar o colunista Hélio Schwartsman: “quando uma escola aumenta sua mensalidade, ela aumenta sua nota no ENEM” (2014, adaptado). 

Ou seja, o resultado divulgado pelo INEP das melhores escolas do Brasil no ENEM não é critério  para que país venham colocar seus filhos  nesses estabelecimentos, ao contrario isso apenas vem confirmar o seu despreparo no trato com a educação. E no futuro  quando alguém lhe perguntar se educação enriquece: Responda. Sim!  "pergunte aos donos de escola"