A SIMBIOSE
DA VIDA MODERNA
Por Alacir Arruda
Outro dia assisti a uma cena do cotidiano que, apesar
de corriqueira, jamais havia atentando. Como
as pessoas são dependentes de celulares! Sobretudo, os celulares modernos.
Estava sentado em um Café no centro da cidade quando passei a observar as
pessoas na rua, algumas chegavam a tropeçar nas calçadas por estarem com o
olhar fixado na tela de seus celulares, não enxergavam um palmo a sua frente. Caminhavam
como robôs hipnotizados com seus “brinquedinhos”. Isso me fez questionar! E se
alguém, ao passar por eles, desse um singelo Bom Dia? Será que se
lembrariam o que é isso?
Há algumas gerações, os indivíduos têm nascido imersos
nesse paradigma denominado “sociedade digital” e são envolvidos por essa
cultura. Vêem como natural operar e orientar seus processos subjetivos mais diversos
e fundamentais no consumismo, na fugacidade, no culto à aparência, na imagem e
em tantas outras estampagens de sua identidade, ou identidades. “Trata-se aqui
do que Freud designou como sistemas de ilusões coletivas e como ideais de ego
da cultura, e do que Marx designou como ideologia” (Ibid., p. 67).
Assim sendo, esse ideal consumista, que chega até mesmo a ser definidor da
atualidade, não é simplesmente um “complô de sinistros especuladores. Antes de
qualquer coisa, ele é um grande movimento cultural, talvez, o maior na história
de nossa cultura desde o cristianismo’’(Calligaris, 1999, p. 31).
Com efeito, podemos observar que o Shopping Center
substitui a Igreja ou a Catedral como referência arquitetônica da cidade. As
imagens idolatradas, agora cobiçadas, são, sobretudo, aquelas expostas nas
vitrines de lojas suntuosas. A sociedade atual cultiva o imediatismo, a
fugacidade, o simulacro e, acima de tudo, se orienta pelo e para o consumo. O
templo do consumo acrescenta às antigas dívidas contraídas pelos cristãos com
Deus, as dívidas contraídas com os credores: sacerdotes do sistema financeiro
pós-moderno.
A “hipertrofia da economia
capitalista”, como diz Costa (2004, p. 131), “diluiu esferas da vida social,
como a política, a religião e a tradição familiar em um consumismo hedonista e
narcisista [...]” sendo estes, hedonismo e narcisismo, os principais
estruturantes do sujeito atual.
Basear a identidade no
narcisismo significa dizer que o sujeito é o ponto de partida e chegada do
cuidado de si. [...] Família, pátria, Deus, sociedade, futuras gerações só
interessam ao narcisista como instrumentos de auto-realização [...]. O
hedonismo, por sua vez, é um efeito desta dinâmica identitária. O narcisista
cuida apenas de si, porque aprendeu a acreditar que a felicidade é sinônimo de
satisfação sensorial. Assim, o sujeito da moral hodierna teria se tornado
indiferente a compromissos com os outros – faceta narcisista – e a projetos
pessoais duradouros – faceta hedonista. (Ibid., p.185)
À primeira vista, somos levados
a acreditar que, com a inserção desses novos valores, os antigos são
abandonados ou substituídos. Entretanto, o referido autor descarta a hipótese da
substituição e diz que há, na verdade, uma “re-hierarquização dos valores
tradicionais sob o dossel da moda” (Ibid.,
p.131). Os valores que norteavam fortemente os sujeitos na modernidade
continuam presentes na subjetividade dos sujeitos pós-modernos, porém,
subjugados e enfraquecidos, literalmente fora de moda.
Atualmente “[...] a
maioria dos indivíduos urbanos elegeram o bem estar e os prazeres físicos como
a bússola moral da vida” (Ibid., p. 131). Logo, grande parte dos sujeitos pós-modernos
busca um ideal de felicidade que está, sem dúvida, intimamente ligado à
dinâmica psíquica designada por Freud (1911/2004) de Princípio do Prazer,
maneira pela qual interagimos com o mundo nas fases iniciais da vida. “De
início as pulsões só procuram descarregar-se, satisfazer-se pelos caminhos mais
curtos” (Laplanche & Pontalis, 2001, p. 367). Contudo, a vida em sociedade impõe
o funcionamento psicológico pautado no Princípio da Realidade que: exige um mínimo
de relações interpessoais. Tenho saudade de um tempo onde um simples Bom Dia
bastava...
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