AYN RAND, FILÓSOFA , E A CORRUPÇÃO.
Por Alacir Arruda
Na década de 20 uma filósofa atrevida já incomodava o mundo capitalista moderno. Ayn Rand. Nascida Alissa Zinovievna Rosenbaum – em São Petersburgo, 2 de Fevereiro de 1905 e faleceu em Nova Iorque, 6 de Março de 1982- foi uma escritora, dramaturga, roteirista e controversa filósofa norte-americana de origem judaico-russa, mais conhecida por desenvolver um sistema filosófico chamado de Objetivismo, e por seus romances The Fountainhead (que foi lançado no Brasil com o título de "A Nascente" e deu origem a um filme homônimo conhecido no Brasil por "Vontade Indômita") e Atlas Shrugged ("A Revolta de Atlas" no Brasil).
Nascida e educada na Rússia, Rand emigrou para os Estados Unidos em 1926. Ela trabalhou como roteirista em Hollywood e teve uma peça produzida na Broadway, em 1935-1936. Ela alcançou a fama com seu romance The Fountainhead, publicado em 1943, que em 1957 foi seguido por seu melhor e mais conhecido trabalho, o romance filosófico Atlas Shrugged. Mas, sem duvida, foram sua reflexões sobre o caráter de alguns homens públicos que a fez conhecida no mundo literário da época. Uma de suas reflexões mais famosas é essa:
“Quando você perceber que, para produzir, precisa obter a autorização de quem não produz nada; Quando comprovar que o dinheiro flui para quem negocia não com bens, mas com favores; Quando perceber que muitos ficam ricos pelo suborno e por influência, mais que pelo trabalho, e que as leis não nos protegem deles, mas, pelo contrário, são eles que estão protegidos de você; Quando perceber que a corrupção é recompensada, e a honestidade se converte em auto-sacrifício; Então poderá afirmar, sem temor de errar, que sua sociedade está condenada.” (Ayan Rand)
Como sabemos, a corrupção é um dos fenômenos mais perigosos para uma nação. Os efeitos econômicos são devastadores, à medida que o custo das empresas sobe, investimentos despencam, as pessoas começam a perder a confiança nas instituições do País e a democracia começa a ser ameaçada. Não é à toa que os países no topo do ranking da transparência internacional, como Finlândia e Singapura, estão entre os mais ricos, enquanto as nações mais corruptas do planeta, como Togo e Gana estão entre as mais pobres. A correlação entre corrupção e subdesenvolvimento é fortíssima.
Qual a sua ideia de corrupção? É quase certo que você fale em desvio, por um administrador desonesto, do dinheiro público. É a ideia que se firmou hoje em dia. Mas, antes disso, a corrupção era termo mais abrangente, designando a degradação dos costumes em geral.
Como a corrupção veio a se confinar no furto do bem comum? Talvez seja porque, numa sociedade capitalista, o bem e o mal, a legalidade e o crime acabam referidos à propriedade. Por analogia com a propriedade privada, o bem comum é entendido como propriedade coletiva — e até como bem condominial, aquele do qual cada um tem uma parcela, uma cota, uma ação.
Mas o bem comum é diferente, por natureza, do bem privado. No estatuto de uma sociedade comercial, é obrigatório incluir o destino a dar aos bens, caso ela se dissolva. Se constituo uma firma com um sócio, caso a fechemos repartiremos os bens que pertencem a ela. Mas isso é impossível quando se trata da coisa pública. Há certos “bens” que só ela produz e que não podem ser divididos: virtudes, direitos e uma socialização que não só respeita o outro como enriquece, humanamente, a nós mesmos.
Pensar o mau político como corrupto e, portanto, como ladrão simplifica demais as coisas. E sinal de que não se entende o que é a vida em sociedade. O corrupto não furta apenas: ao desviar dinheiro, ele mata gente. Mais que isso, ele elimina a confiança de um no outro, que talvez seja o maior bem público. A indignação hoje tão difundida com a corrupção, no Brasil, tem esse vício enorme: reduzindo tudo a roubo (do “nosso dinheiro”), a mídia ignora — e faz ignorar — o que é a confiança, o que é o elo social, o que é a vida republicana.
A corrupção continua, porém, sendo um tema republicano - só que com outro sentido, outro conteúdo. Ela ainda é o grande perigo para a república. Como esta valoriza o bem comum, todo desvio dele para o particular a ameaça. Mas nossa ideia de corrupção é mais fraca que a antiga.
Chamamos de corrupção o furto do patrimônio público. Ora, isso faz esquecer que o bem público tem natureza distinta do bem particular ou da propriedade privada. Muitos se referem ao Estado como se fosse equivalente a um indivíduo ou empresa. Com isso, ficam na perspectiva patrimonialista, cujos problemas vimos no capítulo anterior.
Uma saída para a pouca importância, hoje, do tema da corrupção seria apostar na educação. Diríamos: a corrupção ameaça a república, mas não se resume no furto do dinheiro público. O corrupto impede que esse dinheiro vá para a saúde, a educação, o transporte, e assim produz morte, ignorância, crimes em cascata. Mais que tudo: perturba o elo social básico que é a confiança no outro. Quem anda por nossas ruas, com medo até de crianças pequenas, e depois se espanta com a descontração das pessoas em outros países pode sentir o preço que pagamos por não vivermos numa república — por termos um regime que é republicano só de nome.
A saída educativa é indispensável. Mas ela exige dar à educação dos costumes um sentido distinto do que teve no antigo pensamento republicano. Não se trata mais de conter a sexualidade, de promover a castidade e a discrição. Os costumes viáveis, a educação desejável em nosso tempo têm a ver com a realização pessoal. Será preciso combinar essa promoção de si com o respeito devido ao outro. E será necessário, mais que tudo, recuperar — ou reinventar — a ideia de que haja algo, no espaço comum a todos, que seja mais do que um simples arremedo social da propriedade privada.
Despertem seres humanos! Nossa sociedade está doente.
Contato: agaextensao@gmail.com
Boa tarde Alacir. Muito bom o texto. Confesso que nunca pensei sobre corrupção sob a percepção dessa ótica. Com essa leitura , tenho uma nova reflexão. Parabéns, por nós esclarecer de maneira tão contundente. Vou compartilhar.
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