sábado, 26 de agosto de 2017

As bestas....

"OS BESTIALIZADOS 2".

Por Alacir Arruda
Que temos os piores políticos do mundo, um sistema educacional sedimentado na falácia instrumental que nada ensina , um  modelo de segurança digno de fazer inveja aos aplicados por Hitler e Mussolini e poderes viciados em interesses individuais disso todos sabem. porém, entretanto, todavia,  meu objetivo é outro: é tentar entender que povo e este, qual seu imaginário político e qual sua prática política.

Em épocas de Impeachment, Lavas-jatos e a certeza de que perdemos o rumo vou buscar numa das maiores obras literárias brasileiras - Os Bestializados de Jose Murilo de Carvalho- subsídios para tentar explicar aquilo que muitos julgam inexplicável, qual seja, o comportamento do povo brasileiro diante disso tudo.

O livro Os Bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi, de José Murilo de Carvalho se refere ao estudo da prática de cidadania entre o povo brasileiro no início da República. Utilizando-se de inúmeras fontes, que vão desde revistas e jornais da época a documentos oficiais, desde artigos e teses a livros conceituados, o autor constrói seu trabalho de maneira singular. O trabalho é dividido em cinco capítulos, além da conclusão, notas, caderno de fotos e bibliografia no final. São ao todo 196 páginas muito bem utilizadas, e que vale a pena serem lidas. Logo na introdução ele lança o questionamento que buscará responder no decorrer do livro: por que o povo era considerado bestializado? Qual a razão de sua apatia política? Num primeiro momento, ao ler-se o título da obra, pensa-se até que o autor tratará da passividade do povo brasileiro, de sua inércia política. Mas seu objetivo é outro: é “tentar entender que povo era este, qual seu imaginário político”.

Os Bestializados do século XXI pouco diferencia daquele do final do seculo XIX, grande parte da massa não entende o que ocorre em Brasilia, rimos como bobo alegre da nossa própria desgraça, somos motivo de piada internacional e vibramos quando aparece um salvador da pátria que, como o detentor da espada do Rei Arthur, nos salvará das mãos impiedosas dos nossos algozes. Ou seja, sonhamos! Vivemos uma Utopia de Hobbes, onde o Leviatã do momento é Sergio Moro, mas no passado já foram Collor, FHC e Lula, enfim, não interessa quem; o importante e termos alguém que "cuide" de nós, afinal não seria essa a figura da república? Uma mulher desnuda com os seios amostra que sacia a fome dos seus? Que cuida do povo? 

Segundo o Dados do Data Folha à época do impedimento da ex Presidente Dilma, menos de 15% da população brasileira sabia o que era Impeachment, 10% nunca tinham ouvido falar em Michel Temer e para 74% Lava Jato é um posto de gasolina que também lava carro, salve a ignorância. Temos mais, menos de 8% sabiam o papel das duas casas do Congresso, 4% a função de um senador e 12% a de um deputado o STF era uma sigla incompreensível para 92% dos entrevistados e pasmem, para 55% Lula ainda era Presidente ( bom esses acertaram..)...Como diria Francelino Pereira no auge da ditadura: "que país e esse"? Deixo aos senhores essa resposta.

Ora, sou um educador e como tal não tenho pretensão alguma de mudar o imutável, de sonhar com o irrealizável ou de pensar que algo extraordinário ainda ocorra nesse seculo, tenho massa cinzenta o suficiente para entender que em educação o máximo que posso fazer é a minha parte: educação e a arte do possível. E por que insisto? Não sei, talvez teimosia ou irresponsabilidade mas não consigo me calar diante desse disparate de coisas estranhas que vejo passar diante dos meus olhos. Sabe por que nos acostumamos com tudo isso? Porque toda mudança exige sacrifício, esforço, e não somos ensinados a isso, tudo que o mundo nos oferece é mais prático, mais cômodo, acessível, então permanecemos sempre dependentes. Quiséssemos nós desde cedo, ter sido ensinado a lutar, não desistir, perseverar, sacrificar...hoje estaríamos muito mais a frente de outras nações, seriamos muito melhores

Ao final do seu livro, Jose Murilo pontua que a República não era para valer. O discurso bonito do Estado não condizia com a realidade. Quem percebia isso não era bestializado. “Bestializado era quem levasse a política a sério, era o que se prestasse a manipulação (...) Quem apenas assistia, como fazia o povo o Rio por ocasião das grandes transformações realizadas a sua revelia, estava longe de ser bestializado. Era bilontra [gozador, espertalhão].” (p. 160). Em sua conclusão o autor explica que como não aconteceu uma República real, ou seja, o governo nunca foi uma coisa pública, a cidade não teve cidadãos, nesse sentido. Estes se relacionavam com o Estado da maneira que conseguiam. Como a cidade foi impedida de ser República, foram formadas várias repúblicas, onde os cidadãos foram construindo a sua identidade coletiva.

Fazendo uma analogia com a atualidade, hoje podemos dizer que reina o "cada um por si e o diabo por todos", onde os interesses pessoais estão a frente de valores como cidadania, ética comprometimento etc. Sabemos que a corrupção impera porém, a vingança do povo se dá com a indiferença a não participação no debate politico enfim...é a forma encontrada pelos bestializados de se fazerem vistos. Por mais contraditório que isso possa parecer é forma legitima ( mesmo que não a ideal), de manifestação..


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6 comentários:

  1. O Alacir, gostei do texto. Você me deu aula de Geopolítica no colégio Drummond (ANGLO) de Lorena-SP em 2003. Sempre achei aulas muito loucas e inspirei em você, hoje sou Cientista Politico pela Unicamp e tenho mestrado em Ciência Politica pela University Of Illinois Urbana -USA. Agora em outubro estou indo para Belgrado (Servia) fazer o doutorado em "Processos de Limpeza Étnica nos Bálcãs". Nao sei se você lembra, mas um dia nos corredores da escola você que me deu esse tema em 2004. Estou postando isso não para me aparecer, mas para que saibam quem você é, ou foi um dia. Saudades de você amigo. Uma pena o que fizeram com você, é um professor acima da media em sala de aula, dono de um conhecimento único e incomodou, por isso te perseguiram. Te admiro pacas. João Paulo de SP

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    1. Querido joazinho que felicidade a minha em saber disso, é logico que me lembro de você, conversávamos muito nos intervalos à época. Sim eu me lembro de ter dito a você que escrevi muito sobre o processo de limpeza étnica aplicado nos Bálcãs, que alegria saber que irá para Belgrado esse tema,me mande noticias . Felicidades e sucesso.

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  2. Oi Alacir. Como sempre mais um texto que é um verdadeiro show. Mais uma sugestão de leitura. Já me despertou para ler este livro. E além disso , fico impressionada com o carinho e admiração de seus ex alunos. Nos leitores também te admiramos muito. Abraços

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    1. Ola querida Naildes, obrigado por sempre prestigiar o blog. Abraços

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    2. Bom dia Alacir. Como você me disse uma vez que o conhecimento nos liberta, então eu queria me livrar de mais uma ignorância. Será que você poderia escrever sobre o processo de limpeza étnica aplicado nos Balcãs. Fiquei curiosa para conhecer sobre o assunto.

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