SCHOPENHAUER E OS NOSSOS DESEJOS.
Por Alacir Arruda
Vejamos se consegue resistir: você compraria algo (que não precisa) apenas pela simples vontade ou desejo de possuir este objeto? Até que ponto seus desejos manipulam suas ações? Como a sociedade tem se transformado, cada vez mais, em uma sociedade de consumo?
Mesmo sem frequentar um há 10 anos - por opção - não consigo imaginar lugar mais propício para o afloramento dos desejos de consumismo que um Shopping Center. As lojas com suas marcas de luxo, suas vitrines iluminadas, anúncios de promoções e descontos e suas fachadas chamativas são uma verdadeira tentação para pessoas que gostam de comprar pela simples vontade de matar um desejo consumista. É o comprar pela vontade de comprar, sem nenhuma necessidade objetiva do objeto desejado.
Mas talvez belas lojas e vitrines enfeitadas não chamem sua atenção. Mas o ponto aqui não são as lojas, nem o consumo em si, mas a questão do desejo. Quem sabe, diferente de muitas pessoas, seu ponto fraco não seja o consumismo. Quem sabe você é daqueles que não abre mão de sair todas as noites para se divertir, ou não resiste a um belo e apetitoso jantar.
Será que nossos desejos nos manipulam, nos fazendo tomar determinadas decisões que não tomaríamos caso esse desejo não existisse? Será que o (aparente) inofensivo desejo de possuir algo condiciona nosso estilo de vida, os lugares que frequentamos e nosso circulo de relacionamentos? Segundo o filósofo alemão Artur Schopenhauer sim. Para ele, você não tem nenhum qualquer controle sobre suas vontades. Quem sabe isso amenize o sentimento de culpa daqueles que estão com a conta bancária e o cartão de crédito no vermelho por excessos futilidades....
Schopenhauer acabou desistindo de dar aulas - o inveja- em 1818 e passou a viver da herança de sua família. Escreveu sua principal obra aos 30 anos, intitulada “O Mundo como Vontade e Representação”, mas sem lograr êxito no início (livro que, após sua morte, passou a ser considerado uma das obras chave da filosofia ocidental). Durante anos, Schopenhauer não parou de atualizar sua obra, que ganhou uma nova versão com um segundo volume de notas e aditamentos em 1844.
No livro, Schopenhauer declara que a realidade tem dois aspectos, vontade e representação, sendo a primeira a força cega encontrada em todas as coisas e a representação, a construção da realidade em nossa mente, ou seja, a maneira que encontramos para dar um sentido a todas as coisas que nos cercam. O conceito de representação se encontra na filosofia de Kant com outro nome, o “mundo fenomênico”.
A vontade é cega pois não a controlamos. É uma força única por trás de tudo. Em nada tem a ver com a ideia de Deus ou de um ser superior. Para Schopenhauer, não há alguém que a direcione. Já a representação é o mundo em que vivemos, como vivenciamos e sentimos nossas experiências.
Para o filósofo, o mundo é uma representação de cada indivíduo. Ele tratava da relação entre sonho e realidade, em que seria impossível para o homem diferenciar essas duas condições. Nesse sentido, a vida seria um longo sonho que é interrompido durante a noite por sonhos menores. Nas palavras de Schopenhauer, “não é talvez toda a vida um sonho? Mais precisamente: existe um critério seguro para distinguir sonho e realidade, fantasmas e objetos reais?” Assim, para Schopenhauer, não teríamos condições de saber se estamos em um longo sonho ou se o que estamos vivenciando é, de fato, a realidade.
Para o filósofo, haveria um elemento essencial que levaria o homem a ter vontade de continuar vivendo, mesmo sabendo que o seu fim é a morte certa. Como nosso próprio corpo é o único objeto que conseguimos conhecer no Universo, na medida em que não o reconhecemos de fora, mas de dentro, o Eu é a vontade de viver. Mesmo sabendo de nossa morte (que inevitavelmente nos alcançará um dia) continuamos por buscar a sobrevivência.
Aliado à ideia da vontade como elemento preponderante do viver humano, para Schopenhauer o amor não existe, sendo uma artimanha da natureza para a preservação da espécie. Seu pensamento sobre o amor contraria todos os demais pensamentos da época, motivo pelo qual suas ideias foram relacionadas ao pessimismo em relação à vida.
Assim, segundo o filósofo, depois de realizado o ato sexual e atingido o prazer, o homem experimenta um sentimento de desilusão ao constatar que tudo que desejou tão ardentemente nada mais é que qualquer outra satisfação de um mero desejo sexual.
Schopenhauer foi duramente criticado por aliar elementos orientais à sua filosofia. A visão pessimista do filósofo comunga com a visão do budismo, que declara que tudo na vida é sofrimento, sendo o homem o único ser vivo que busca coisas que nunca poderá possuir.
Essa frustração resulta em uma felicidade passageira, pois o ser humano é um ser que sempre está à procura de coisas novas, nunca estando satisfeito com o que tem. Podemos constatar isso tendo nós mesmos como exemplo. Reflita em quantas vezes você desejou algo e quando atingiu teve o prazer de se sentir feliz, mas, logo em seguida, essa felicidade foi se esvaindo, dando lugar a um novo desejo, e assim por diante. Me recordo aqui uma frase do escritor e dramaturgo irlandês Oscar Wilde: "O ser humano se frusta duas vezes na vida, a primeira quando tenta atingir algum objetivo e não consegue e a segunda quando consegue". Quer algo mais schopenhaueriano que isso?
Para Schopenhauer, uma das principais causas do sofrimento humano é esse incessante desejo de buscar coisas que possam nos proporcionar uma felicidade duradora sem nos darmos conta de que essa busca, por si só, é inútil, pois nunca estaremos totalmente satisfeitos com o que adquirimos.
Ao satisfazer seu desejo, o homem tem, por um breve momento, o gosto da felicidade, mas logo em seguida volta a se sentir incompleto e insatisfeito, recomeçando uma nova busca para satisfazer um novo anseio que surgiu logo após a conquista do primeiro. Isso gera um clico interminável de buscas e desejos.
Anos mais tarde, o famoso filósofo Nietzsche, baseando seu pensamento na filosofia de Schopenhauer, escreveu: “A felicidade é frágil e volátil, pois, só é possível senti-la em certos momentos. Na verdade, se pudéssemos vivenciá-la de forma ininterrupta, ela perderia o valor, uma vez que só percebemos que somos felizes por comparação”.
A vontade, considera Schopenhauer, é a força fundamental da natureza, pois cada indivíduo a manifesta para dar sentido a sua própria sobrevivência. Para ele, a vontade é um impulso escuro e vigoroso, sem justiça ou sentido. Assim, um indivíduo sem vontades não possui motivação suficiente para viver, não consegue enxergar sentido e propósito na sua existência.
Para Schopenhauer, a contemplação da arte é uma forma de suprimir, mesmo que temporariamente, o estado de sofrimento humano causado pela busca incessante pela satisfação de suas vontades. O filósofo eleva a música à categoria de arte suprema
É interessante notarmos a importância que Schopenhauer concede à música. Para ele, “a música exprime a mais alta filosofia numa linguagem que a razão não compreende”. Schopenhauer foi o primeiro filósofo a elevar a música para um patamar superior, influenciando o pensamento de Nietzsche sobre ela, que escreveu que “sem música a vida seria um erro”.
Presente na terceira parte do livro “O Mundo como Vontade e Representação”, a música assume papel importante na filosofia de Schopenhauer. Para o filósofo, a contemplação da arte é uma forma de suprimir, ainda que temporariamente, o estado de sofrimento humano causado pela busca incessante pela satisfação de suas vontades.
Assim, ainda que Schopenhauer entenda o viver humano como um constante sofrimento em virtude do homem sempre buscar satisfazer algo que é insaciável (o desejo humano), o filósofo concede uma solução: tornar-se livre da vontade para atingir a contemplação.
Ao libertar-se de seus desejos, o homem é livre para atingir o sublime e o filósofo elege a arte como meio para isso e consagra a música como a arte suprema. Nesse sentido, a música é capaz de expressar a vontade fazendo uso de uma linguagem grandiosa. Por meio dos tons, ritmos, harmonias e melodias, a música é capaz de revelar a essência interior do mundo, o desejo, que move a natureza humana, enquanto a filosofia é capaz de apenas reproduzir a essência do mundo através de conceitos gerais.
A grande verdade é que Schopenhauer nos ensina a viver um dia de cada vez, sem fazer planos, afinal a vida - por si só - não tem o menor sentido, somos nós que damos sentido a ela a partir da realização das nossas vontades. Eu li Schopenhauer a primeira fez com 17 anos desde então tenho buscado praticar - mesmo sem as vezes conseguir - o que ele sugere: "Carpie Diem"
-Deixo abaixo uma série de obras escritas por esse filósofo, sugiro que leiam, principalmente aqueles que farão o ENEM.
A arte de escrever | A arte de insultar | A metafísica do belo | Aforismos para a sabedoria da vida | Dores do mundo | Esboços de uma história da doutrina do ideal e do real | Metafísica do amor, metafísica da morte | O Mundo Como Vontade e Representação (Livro III) | O Mundo Como Vontade e Representação (Livro IV) | A morte e a dor | Algumas palavras sobre o panteísmo | Como vencer um debate sem precisar ter razão: 38 estratagemas | Do pensar por si | O sistema cristão | O vazio da existência | Religião, um diálogo | Sobre a filosofia universitária | Sobre educação | Sobre livros e leitura | Thomas Mann
Professor, eu li Schopenhauer na época da faculdade achei interessante, mas confesso é um livro de difícil leitura. Agora lendo o seu texto eu consegui entender o que é vontade e o que representação, fato que na época me fez tirar 3,0 numa prova de filosofia (ô frustração). Se bem que minha professora, bem senhora, só sabia passar slides e ler nas aulas. De toda forma lendo seu texto voltei 10 anos no tempo e relembrar Schopenhauer. Queria muito saber mais sobre ele. ****Patricia-Cbá***
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