terça-feira, 28 de novembro de 2017

Hannan Arendt e o Brasil

HANNAN ARENDT DIRIA: A  CORRUPÇÃO NO BRASIL  É COISA BANAL..

Por Alacir Arruda

As vezes fico pensando se a grande filósofa alemã-americana Hannan Arendt ( 1906-1975) fosse brasileira, o que ela pensaria de tudo isso? Na primeira metade do século 20, o mundo conheceu um dos períodos mais bárbaros da humanidade, se visto sob o aspecto do morticínio que vigorou na Europa, sob os auspícios dos tiranos Adolph Hitler e Joseph Stalin. Para qualquer um desses monstros, matar um milhão de pessoas era só uma questão de colocar mais tinta na caneta que assinava as sentenças de morte. A filosofa alemã Hannah Arendt, ao escrever “As Origens do Totalitarismo, traduzido no Brasil por Celso Lafer, referiu-se a esta época como sendo a da “banalização do mal”.

Poucos brasileiros tomaram conhecimento – mesmo porque muitos já não estão podendo comprar jornal ou revistas semanais e a internet só fala de Anita - que um trabalho recente do Ministério do Planejamento, deixou patente que a corrupção no Brasil já alcançou 200 BILHÕES de reais por ano, ou 16% do PIB, num país que há mais de 20 anos, patina a uma taxa média de 2,3%.  Este cálculo corrobora uma estimativa da FGV que chegara aos 230 bilhões de reais ate 2018. Este tema não mereceu as manchetes dos jornais, porque nesses últimos 20 anos a corrupção banalizou-se de tal forma no Brasil, que os dirigentes públicos e seus clones na iniciativa privada nos furtam com tal aisance, que sua súbita ascensão nas colunas sociais já não impressiona ninguém. 

É certo que nenhum país do mundo conseguiu até hoje dar fim â corrupção, mas é possível diminuir sua incidência, se um trabalho sério for feito nesse sentido. E se o Brasil pretende ser respeitado, a ponto de ser eleito para o Conselho de Segurança da ONU, terá primeiro que varrer a casa. A multinacional KROLL, que se dedica ao cálculo de riscos para os investidores, informa que os dois maiores riscos que um investidor enfrenta hoje no Brasil são: a carga tributária, sempre em ascensão, e a corrupção. É evidente que estes riscos estão interligados, pois se diminuirmos a taxa de corrupção, poderemos igualmente diminuir a carga tributária. Não poderemos ser levados tão a sério quanto o desejaríamos, se levarmos em conta que a organização Transparência Internacional, nos agraciou com grau 3,9 – numa escala de 1 a 10 ,utilizada para medir a corrupção entre 130 países investigados. Os países escandinavos alcançaram, em media, grau 9. Na America do Sul perdemos ate para a Venezuela.

Hoje no Brasil, percebe-se que o governo Temer quer transformar as próprias  acusações e  dos empreiteiros contra a Turma do Pudim em fato banal. Algo tão corriqueiro que nem notícia merece ser. Tal discurso embute a premissa de que a corrupção é inexorável, assim como o caixa dois nas campanhas eleitorais. É como se esconder diamantes na Suíça fosse tão comum quanto político pintar o cabelo de acaju.

Mas o discurso está emplacando. De tão anunciada, a chamada delação do fim do mundo  virou  notícia velha na época,  mesmo  antes mesmo de ser publicada. Falou-se tanto dos 77 delatores da Odebrecht que eles já se tonaram clichê, lugar comum, déjà vu. Exagero? Quem atentou mais de dois minutos à denúncia contra Aécio Neves, baseada em vazamento parcial de delação odebrechtiana? Qual denúncia?

Um argumento contra a banalização é que a indignação da opinião pública contra a impunidade não deixará o descaso prevalecer. Contra ele servem as prisões dos azarados que ficaram nas mãos de juízes de primeira instância. Ver o ex-todo-poderoso presidente da Câmara dos Deputados algemado, o ex-governador de camiseta verde Bangu ou o ex-bilionário de cabeça raspada aplaca o desejo de desforra contra a classe política.

Enquanto isso, em Brasília, a elite com foro privilegiado decide qual o melhor juiz para julgá-la no Supremo Tribunal Federal. Como se fosse normal e corriqueiro caber ao criminoso escolher o próprio júri. Vale a lei da vantagem, segue o jogo.

A justificativa prática para a desfaçatez é que alguém precisa fazer o serviço impopular das reformas previdenciária, trabalhista e todas aquelas que tiram votos em vez de dar. Como ninguém quer fazer campanha prometendo aumentar o tempo de contribuição para o trabalhador poder se aposentar, melhor deixar isso para um governo sem pretensões de se perpetuar no poder – como se seus integrantes não fossem poder há 30 anos.

Finalmente, há o argumento “melhor isso do que voltar o PT”. De todos, é o mais sincero. Aos amigos, tudo; aos inimigos, a lei.

Se Temer e seus asseclas tiverem sucesso onde os petistas falharam e conseguirem emplacar o discurso da banalização da corrupção, vai se consolidar uma divisão dos políticos em duas castas: os comuns, sujeitos a tomar banho frio em Curitiba a mando de juízo de primeira instância, e os alforriados, beneficiados pelo acúmulo de processos no gabinete de um ministro do STF.

Como diria aquele policial federal,  tudo é uma questão de timing. Para uns, o tempo urge. Para outros, urge não ter pressa. Não convém manipular o teor de vereditos, melhor trabalhar o calendário. É o suficiente para moldar o jogo político e eleitoral. De um lado, dá-se prazo para aprovar reformas no Congresso. De outro, criam-se condições para limar candidaturas.

Enquanto ainda é presidenciável, Lula obstrui candidatos do mesmo campo político – mesmo com rejeição recorde, tem mais intenção de voto do que qualquer companheiro. Quanto mais demorar para o petista ser declarado inelegível, menos tempo sobrará para cultivarem-se alternativas no petismo. Se, por fim, ele não puder disputar, aumentará o espaço para quem surfe a onda que elegeu Trump nos EUA. Salvo, claro, se Lula ser absolvido por Moro

Se ressuscitasse no Brasil, Hannah estaria hoje escrevendo sobre a “banalização da corrupção” que mata de inanição milhões de brasileiros, sem que se tenha nem mesmo o trabalho de assinar uma sentença.

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