terça-feira, 20 de junho de 2017

Aula nada ensina e prova não avalia ninguém

"O PODER PÚBLICO INSISTE EM VELHAS FÓRMULAS. POR QUE OS PROFESSORES NÃO OCUPAM SUAS ESCOLAS?"

Por Alacir Arruda

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Há mais de cem anos, Almada Negreiros escreveu: "Quando eu nasci, todos os tratados que visavam salvar o mundo já estavam escritos. Só faltava uma coisa: salvar o mundo. Karl Marx no século XIX proferiu: " Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diversas maneiras; o que importa é modificá-lo". Essa máxima pode ser aplicada aos professores. Chega de " conversa fiada" ! Basta de teóricos engravatados, que nunca pisaram numa sala de aula , de Brasilia determimar o que você deve fazer.

Quando decidi ser professor, todos os tratados que visavam salvar a educação já estavam escritos. Só faltava refundar a escola, salvar a educação, sair da zona de conforto. 

Já na distante década de 1990, nós nos especializamos em questionar o instituído. Os enunciados dos projetos requeriam que se educasse para e na autonomia. Porém, professores conservadores e cativos de uma platônica caverna, para onde uma “formação” deformadora os havia atirado, semeavam heteronímia. 

Vivíamos,e ainda vivemos, em uma tradição centralizadora e autoritária que recusa às escolas o direito à autonomia, contrariando a lei. 

Pacheco: “Há jovens brasileiros que não se mostram condescendentes com ministeriais disparates e ocupam escolas. (…) Deveriam ser os professores” 

Na época, Medidas Provisórias ministeriais adiavam a refundação da escola e negavam o direito à educação. A crença nas virtudes da velha escola mantinha os professores na ilusão de uma possível melhoria de um modelo em decomposição. Se a família terceirizava a educação dos seus filhos e a escola não ensinava, uma sociedade doente considerava normal que assim fosse.

O contraste entre a sofisticação do discurso e a miséria das práticas tornava-se insustentável. Se as medidas de política educativa negavam a muitos alunos o direito à educação (direito consagrado na Constituição e na Lei da Bases), o poder público teria direito de manter tais políticas? 

Se o modo como as escolas funcionavam provocava a exclusão de muitos jovens, as escolas poderiam organizar-se desse modo? Se, do modo como ensinávamos, muitos alunos não aprendiam, teríamos o direito de continuar a trabalhar desse modo? Cadê a ética? 

Estas foram algumas das nossas pré-ocupações. Até ao momento em que, fundamentando as nossas reivindicações na lei e numa ciência prudente, assumimos o estatuto de autonomia, dignidade profissional. Reivindicamos condições de desenvolvimento dos projetos político-pedagógicos, exigimos respeito pelas decisões (políticas e pedagógicas) das nossas escolas e comunidades. 

Da pré-ocupação passamos à ocupação. 

No Brasil, ao cabo de vinte e um anos, o artigo 15º da Lei de Diretrizes e Bases do Florestan [Fernandes] e do Darcy [Ribeiro] que assevera: " Os sistemas de ensino assegurarão às unidades escolares públicas de educação básica que os integram progressivos graus de autonomia pedagógica e administrativa e de gestão financeira, observadas as normas gerais de direito financeiro público." Hoje isso é letra morta. A lei não foi cumprida e o poder público insiste no fomento de velhas fórmulas. 

Bem nos avisava o Anísio [Teixeira]: Habituamo-nos a viver no país proclamado. Não no país real. Não existe uma política de Estado. Existe uma prática de desgovernos.Mas há jovens brasileiros que não se mostram condescendentes com ministeriais disparates e ocupam escolas. Surpreende-me que sejam os jovens a ocupar escolas. 

Deveriam ser os professores a ocupá-las. Porque os jovens sabem aquilo que não querem, mas ignoram a escola a que têm direito. Suponho que os professores saibam…Se o sabem, por que se mantêm apáticos, quando, na formulação de política educativa, critérios de natureza administrativa se sobrepõem a critérios de natureza pedagógica? 

Por que não cumprem os seus projetos? 
Por que consentem que burocratas lhes imponham a mordaça do “dever de obediência hierárquica”? 
Onde estão os professores? 
Por que não agem no chão da escola e da comunidade, fazendo o que é preciso e inadiável, assumindo um estatuto de autonomia? 
Por que não ocupam as suas escolas? 

Por quê .. ? por quê..? 

Acho louvável e necessário a luta dos professores por valorização e melhores salários, mas é sofrível o grau de comprometimento de grande parte com uma educação transformadora. Vivem a repetir o que Saraiva, Record, entre outras editoras produzem. Estão sempre com livros de alguém nas mãos. Cadê os seus? Pedro Demo ( decano da UNB) é enfático ao dizer que cada professor deve produzir o seu próprio material e não ser cópia de qualquer autor. Vivemos uma escola de copiadores, segundo Demo; o professor copia a aula de algum livro e passa para o aluno copiada, esse por sua vez copia de algum outro livro e devolve como trabalho, ou seja, "vivemos um sistema de cópias". Onde esta a criatividade do docente? 

Dei aulas por 23 anos e jamais...Repito! Jamais entrei em sala e aula, seja no ensino médio seja na universidade, com qualquer material outro, que não a minha própria consciência. Consciência essa fruto de muitas leituras, de deduções e construções próprias do que seja o conhecimento. Eu estava certo? Talvez não! Ou quem sabe estivesse. Isso não me interessava, o que interessava era ver meu aluno produzindo conhecimento, lendo, pesquisando, enfim; sendo o agente do processo. No atual modelo onde está o aluno como agente do processo? Podemos resumir toda essa pantomima na famosa "pedagogia do blá..blá..blá..", onde falam muito e agem pouco. Prova são aquelas malditas reuniões pedagógicas que eu defino como: "momentos onde um grupo de professores se reúnem pra discutir tudo, sobre absolutamente nada". Tudo balela.

E para finalizar, Pedro Demo ainda afirma que: "dentre as atribuições do professor moderno, a mais inútil é a aula". Mas a que aula Demo se refere? Àquela que ja vem pronta pelo professor, que é engessada, apostilada e obriga o educando a decorar conceitos e fórmulas que nada acrescentarão em sua vida.. É essa "maldita, aula" que faz com que 85% dos adolescentes brasileiros detestem sala de aula, odeiem seus professores e prefiram o facebook. E para não dizer que não falei de flores, cito novamente o teórico português José Pacheco , que é categórico ao afirmar que: " aula não ensina nada para ninguém e prova não avalia qualquer coisa".. 

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2 comentários:

  1. Alacir é uma pena você ter abandonado a sala de aula, pois sou prova viva disso tudo que escreveu. Realmente como um dia você nos disse: "existe matéria ruim,e existe professor que consegue ser pior que a materia".Saudades de suas aulas.

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  2. Oi Alacir. É verdade o que diz, por isso as editoras que você citou estão enriquecendo tanto. Lembrei dessa frase na prova de mestrado: professores cópias e dador de aula e comentei. Além da pouca remuneração, a maioria não quer saber de se qualificar. E os que procuram qualificação são taxados de loucos. Quando será que virá essa melhora?

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