O Brasil não tem nenhum projeto nacional de
longo prazo.
Por
Alacir Arruda
"O problema macroeconômico brasileiro é o
crescimento medíocre, que não se apóia em investimento nem público nem privado
e que foi mantido pela evolução favorável das exportações primárias brasileiras
(minério, soja, proteínas, açúcar, tendo a presença crescente de petróleo
bruto) e pelo endividamento assustador das famílias com compras (de veículos,
eletrodomésticos etc) e com a corrosão de suas rendas familiares com os juros
leoninos", assevera Carlos Lessa,
economista, ex-presidente do BNDES, no artigo "Desconfiança empresarial
I", publicado no jornal Valor, ainda em 2012. Para Lessa ; "há uma desconfiança estrutural no empresariado que está no
Brasil". (Carlos Lessa - Jornal Valor Econômico -2012)
É
previsível que a leitura oficial da política econômica sempre procure manter os
corações brasileiros aquecidos e se esforce por renovar esperanças. Em tempos
de crise, essa postura reproduz uma sucessão de declarações enigmáticas, cada
uma delas apoiada em uma dimensão. Sua sucessão acaba amplificando
desconfianças.
No dia
17 de julho, o Banco Central assumiu uma tonalidade otimista e
prognostica um crescimento de 4% para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2013, a partir do trimestre
final do ano corrente, para o qual prognosticou algo maior que 1%; anuncia que
haverá a cobertura de todo déficit em conta corrente a partir de investimentos
estrangeiros diretos e a melhora da inadimplência e atraso de pagamentos entre
15 e 90 dias (fala de uma estabilização da inadimplência das famílias em torno
de 8%). Porém, em 13 de junho, a presidente Dilma havia afirmado que
"o Brasil terá de superar as turbulências da crise econômica externa com
base na força de seu mercado doméstico". Dilma afirmou, também, que
"ainda há margem para o aumento de consumo" e do endividamento por
parte das famílias e, simultaneamente, defendeu medidas de estímulo ao consumo
e ressaltou que "os investimentos públicos devem se intensificar no
segundo semestre".
Em
passado recente, o governo exaltava o dinamismo (?!) da economia brasileira,
mas frente ao "pibinho", abandonou o "pibão" como
justificativa político-econômica. A presidente Dilma, no dia 12 de
julho, mudou o centro de seu otimismo, afirmando que "uma grande nação
deve ser medida por aquilo que faz para suas crianças e adolescentes; não é o
PIB, é a capacidade do país, do governo e da sociedade de proteger o que é seu
presente e seu futuro, que são suas crianças e seus adolescentes".
Entretanto, Guido Mantega, o ministro da Fazenda, alegou que o aumento
de gastos com educação para 10% do PIB "quebra o Estado" e cobrou
ousadia dos empresários, numa reunião onde explicitou a seguinte pérola:
"A crise atual é tão grave quanto a de 2008".
Poderia polemizar com todas essas declarações e justificativas oficiais
para reiterar que o problema macroeconômico brasileiro é o crescimento
medíocre, que não se apoia em investimento nem público nem privado e que foi
mantido pela evolução favorável das exportações primárias brasileiras (minério,
soja, proteínas, açúcar, tendo a presença crescente de petróleo bruto) e pelo
endividamento assustador das famílias com compras (de veículos,
eletrodomésticos etc) e com a corrosão de suas rendas familiares com os juros
leoninos. Ativar o investimento produtivo das empresas, retomar
uma taxa de investimento de, pelo menos, 23% a 24% do PIB (superar a ultra
medíocre taxa de 19%) é impossível com um simples apelo ao "espírito
empresarial", que se nutre e se alimenta com desconfianças. Não é repetindo
o pacote de 2008 (com incentivos fiscais), nem reanunciando o PAC (necessário,
urgente e insuficiente) ou assumindo que se repete em 2013 o clima de 2008, que
se reporá confiança no empresariado.
O
Brasil não tem nenhum projeto nacional de longo prazo, a não ser a expansão da
economia do petróleo. Qualquer empresário de médio ou grande porte sabe que a
crise mundial está longe de ser superada. Não iremos revisitar o cenário
inquietante. É fácil constatar que o Brasil não propõe nada viável em relação
aos próximos anos. Qualquer empresário quer incentivos, facilidades creditícias
e tributárias e a remoção dos pontos de estrangulamento de suas atividades.
Sendo uma sobrevivente da desindustrialização e, por vezes, uma beneficiária da
desnacionalização, a empresa no Brasil vê no endividamento familiar apenas uma
defesa da procura corrente e sente a ameaça crescente da inadimplência; não
consegue perceber qual é a política de longo prazo para multiplicar empregos e
renda. O empresário sabe não só que o cenário internacional é de crise, mas
também que o Brasil é extremamente vulnerável às oscilações financeiras (o Bovespa
oscila frequentemente mais que as bolsas do exterior, com as mesmas
vicissitudes internacionais).
Os
japoneses reduziram em 30% suas aplicações financeiras no Brasil durante o
primeiro semestre; o Japão se declara preocupado com a estagnação
brasileira. O patrimônio da família americana diminuiu terrivelmente durante a
crise; o FMI adverte o "Bric" de sua volatilidade; a Moodys
adverte o Brasil. A Krupp alemã põe à venda sua siderúrgica no
Brasil; a General Motors fecha uma planta em São Paulo. Os exportadores
estão preocupados com a instabilidade das relações Brasil-Argentina. A ofensiva
mundial chinesa reduz o espaço das exportações brasileiras. Tudo é conhecido
pelos empresários.
O
empresário sabe que o endividamento sem crescimento do investimento
macroeconômico gera uma bolha de crédito e conhece a devastação que essas
bolhas produzem quando estouram; sabe que o acontece agora em 2013 é um episódio de uma longa crise
iniciada antes de 2008; sabe que o Citigroup tem tido prejuízos
crescentes e que a Libor foi recém-manipulada pelo Barclays; sabe que o
problema espanhol não está superado e que a City de Londres corre o risco de
vir a ser esvaziada.
No Brasil, os empresários sabem que os
desejados incentivos fiscais reduzem o superávit fiscal, mas também que o
governo teme a inflação e considera o superávit fiscal absolutamente
prioritário. Assim, percebem que é extremamente difícil ampliar
significativamente o investimento público. Além disso, sabem que a Petrobras
colocou à venda suas refinarias no Japão e nos EUA, que o diesel subiu e a
gasolina está pressionando nossas importações; percebem a ambiguidade
estrutural na política cambial. É possível afirmar que há uma desconfiança
estrutural no empresariado que está no Brasil. Não dá para tapar essa dimensão
com declarações oficiais como as aqui foram listadas.
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