quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Uma reflexão sobre o jeitinho brasileiro

Afinal, quem somos nós, os brasileiros? À primeira vista, a resposta para essa pergunta é fácil: somos o produto da miscigenação entre os colonizadores portugueses, os índios que aqui viviam e os africanos trazidos como mão-de-obra escrava, além dos imigrantes que chegaram entre os séculos 19 e 20 (alemães, italianos, japoneses). Até aí, tudo bem. Somos, enfim, um povo mestiço genética e culturalmente que, apesar da diversidade, compartilha certos traços em comum.

A questão, porém, fica um pouco mais complicada quando se trata de buscar a essência do que se convencionou chamar de "caráter nacional", aqueles traços que explicam uma série de comportamentos que costumamos encarar com naturalidade, mas que, quase sempre, causam surpresa entre os estrangeiros.

“Não é só um estereótipo. As pessoas aqui se relacionam com mais afetividade. Os brasileiros conversam na rua, enquanto na Europa o silêncio predomina nas estações de ônibus e metrô”, diz o jornalista espanhol Juan Arias, que há 9 anos vive no Rio como correspondente do jornal El País. “Mas fiquei chocado com a burocracia kafkiana para tirar o visto de permanência após casar com uma brasileira. Foram mais de 600 dias de espera, 6 quilos de documentos e a insinuação de que tudo poderia sair rapidamente se pagasse 8 mil reais”, afirmou Árias ao deparar com a nossa já famosa “Burocracia”. 

Brooke Unger, correspondente da revista inglesa The Economist, em São Paulo, é mais um que se diz a um só tempo encantado e estarrecido com certos traços do povo brasileiro. “Quando cheguei ao Brasil pela primeira vez, vi garis em um desfile pelas praias do Rio, numa cena impensável para um americano”. Em compensação, ele diz não entender a espécie de amnésia coletiva diante de casos graves de violência e impunidade. “A maioria dos brasileiros sabe mais sobre o atentado terrorista de 11 de setembro nos USA ocorrido em 2001, do que sobre a barbárie diária  que mata ao menos 5 pessoas inocentes por dia no Rio de Janeiro.  Afinal somos o quê? Criativos ou enrolões, extrovertidos ou indiscretos, cordiais ou malandros, maleáveis ou corruptíveis? 

Recentemente  houve uma enxurrada de denúncias de corrupção dos governos, Lula, Dilma e Temer, com direito a queda de ministros, prisões etc., Nessa baila a discussão sobre do nosso caráter voltou à berlinda. De onde vem nosso jeitinho, nossa informalidade (aqui, até um ex-presidente da República era tratado pelo apelido), nossa naturalidade diante da miséria, nossos preconceitos, nossa capacidade de depositar fé em mais de uma religião? 

O que mais impressiona quem não e brasileiro são os porquês? Por que aceitamos ônibus lotado que mais parecem gaiolas de bois? Por que aceitamos a maior carga tributaria do Planeta, mais de 40% do PIB? Por que aceitamos Jose Sarney na politica desde 1954 comandando o Maranhão e o Amapá como um Caudilho? Por que aceitamos hospitais abarrotados de miseráveis morrendo a míngua em cenas que lembram os sanatórios religiosos da Idade Media? Por que aceitamos, apesar de emergente, ter a terceira pior educação do mundo, em que o governo finge que paga, o professor, este por sua vez finge que ensina, o aluno finge que aprende e a sociedade finge que esta tudo bem? Por que a nossa policia mata mais inocentes que países em Guerra? 

Por que somos omissos ao descaso com nossos idosos, a prostituição infantil, a violência contra a mulher e a criança ? Por que aceitamos um governo que comandou uma desfalque de quase 2 bilhões dos cofres públicos (mensalão, Lava Jato, entre outros nomes engraçados)? Por quê? Por que mantemos Renan, Jucá, Padilha, Moreira Franco,Pezão Temer e seus asseclas soltos? 

Nós somos assim, adoramos levar vantagem em tudo e isso é histórico, quem não se lembra do que fez o escriba Pero Vaz de Caminha assim que comunicou ao Rei de Portugal a descoberta do Brasil: " Vossa Alteza, Senhor, é certo que tanto neste cargo que levo como em outra qualquer coisa que de Vosso serviço for, Vossa Alteza há de ser de mim muito bem servida, a Ela peço que, por me fazer singular mercê, mande vir da ilha de São Tomé a Jorge de Osório, meu genro, o que Dela receberei em muita mercê. Dito isso. Beijo as mãos de Vossa Alteza” (Deste Porto Seguro, da Vossa Ilha de Vera Cruz, hoje, sexta-feira, primeiro dia de maio de 1500)."

Esse é o primeiro caso de nepotismo que se tem noticias em terras brasileiras, de lá para cá os nossos "hábeis" políticos trataram de aprimorar tal comportamento. Quando assumem cargos públicos, nomeiam, sem qualquer cerimonia: esposas, filhos, sobrinhos, irmãos, sogras, noras,genros etc.. É a velha ideia do Estado como uma eterna " vaca leiteira", cheia detetas onde todos querem uma para mamar. 

Outra lembrança que vem a cabeça, é a famosa Lei de Gerson. Para aqueles que não lembram, refrescarei vossas memorias. A tal Lei de Gérson tem origem em uma propaganda que Gérson, um dos melhores meio-campistas da história do futebol brasileiro e ex-jogador de grandes times como o São Paulo Futebol Clube, fez para os cigarros Vila Rica no ano de 1976. Na peça publicitária, o boleiro fala sobre as vantagens do cigarro e pronuncia a seguinte frase: "É gostoso, suave e não irrita a garganta". Na sequência diz: "Por que pagar mais caro se o Vila me dá tudo aquilo que eu quero de um bom cigarro?". Depois de propagandear o cigarro e falar sobre o quanto o produto era bom, Gérson dá um sorrisinho malandro e solta a última e infeliz frase da propaganda: "Gosto de levar vantagem em tudo, certo?". Desta forma, Gerson sintetizou de uma vez só o jeitinho brasileiro de fazer o errado parecer certo.

Apesar de já ser um jogador consagrado na época, Gerson ficou marcado pela propaganda. Depois de algum tempo, o "Canhotinha de Ouro" declarou que ficou arrependido de ter sua imagem associada ao anúncio. Mas já era tarde, seu nome acabou batizando a Lei mais salafrária do país e ficou no imaginário popular. Segundo o diretor do comercial, o publicitário José Monserrat Filho, "houve um erro de interpretação, o pessoal começou a entender como ser malandro. No segundo anúncio dizíamos: ‘levar vantagem não é passar ninguém para trás, é chegar na frente’”.

Com os escândalos políticos que ocorrem frequentemente na política brasileira, tais como fraudes, corrupção, lavagem de dinheiro, superfaturamento, entre outros, a expressão Lei de Gérson acaba surgindo na boca do povão todos os anos. Enraizada na cultura popular, virou sinônimo de levar vantagem acima de tudo, sem respeitar códigos éticos ou morais.

Aqueles que gostam de entender o Brasil, se lembrarão que no século XX, livros como Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre, Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda e Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Júnior, tentaram responder a algumas dessas perguntas. Mas as interpretações clássicas sobre o que é o brasileiro seguem válidas hoje? “A base dessas interpretações ainda é essencial, mas é preciso lembrar que o chamado caráter de um povo é algo que muda a cada instante”, diz a antropóloga Lilia Schwarcz, da USP.

Se o Brasil, e por extensão o brasileiro , “não é para principiantes”, como disse certa vez o Maestro Soberano Tom Jobim, com ajuda de alguns desses especialistas em nossas origens temos hoje um guia para entendermos mais do porque somos assim , ou seja, a genética do jeitinho brasileiro cuja a melhor definição que ouvi ate hoje é: "No Brasil a corrupção está em nosso DNA." 


Se gostou compartilhe..

2 comentários:

  1. Você esta escrevendo demais Alacir, parabéns por me fazer refletir. Leio seus textos e tento ser uma brasileira melhor e mais comprometida com meu país. Bianca

    ResponderExcluir
  2. Tão bom de ler que nossos olhos e cérebro agradecem.

    ResponderExcluir