quinta-feira, 27 de junho de 2013

O  PROCESSO DE (RE) DEMOCRATIZAÇÃO DO BRASIL.


Alacir  Arruda

               Uma das fases mais nebulosos da nossa história ocorreu entre os anos de 1964-1985, período conhecido popularmente como “anos de chumbo”, ou Ditadura. A política não segue um desenvolvimento linear: é feita de rupturas que parecem acidentes para a inteligência organizadora do real (Rémond: 1996, p. 449). Se assim não fosse, teríamos dificuldade em assimilar a idéia de que o processo de (re)democratização do Brasil no período pós-64 foi arquitetado pelos governos militares dos Generais Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo, tendo ainda a participação, como mentor do processo, do General Golbery do Couto e Silva, criador e primeiro diretor do Serviço Nacional de Informações (SNI). É considerando a perspectiva de que houve uma abertura política “por cima” que iniciamos a análise da volta da democracia em nosso país.   
               A crise econômica do Brasil, no início dos anos 1970, estava ligada, externamente, `a questão do petróleo, colocando o país numa situação bastante difícil. Além disso, internamente, o governo Médici, que recém terminara, havia sido de um profundo autoritarismo, o mais pesado até então. Sua ação, através dos órgãos de repressão, deixara muitas marcas na população brasileira. Entre os militares, por seu turno, havia posições muito independentes, tanto sobre temáticas políticas quanto no que se referia à repressão ilimitada em nome da segurança nacional. Tais posicionamentos denotavam fratura na hierarquia e na ordem, sempre tão caras ao setor. Era mister preservar as Forças Armadas como instituição ou poder-se-ia correr o risco de inviabilizar o modelo de Estado desenhado e que vinha sendo executado pelos militares. Assim, a necessidade de modificar a estrutura do regime começava timidamente a se manifestar. 

- DA ABERTURA 

              Para além dos marcos cronológicos, porém, o fato é que da ditadura fez-se a democracia ... (Reis: 2000, p.11). O presidente Ernesto Geisel e seu chefe do Gabinete Civil, o General Golbery do Couto e Silva eram, entre os militares, os articuladores de um projeto político mais amplo, cujo objetivo era propiciar uma maior flexibilização política ao país. Era a teoria da distensão, que naquele contexto, pretendia assegurar um afrouxamento da tensão sócio-política, no dizer de Alves (1987, p. 185). O objetivo de tal atitude, era traçar os passos que pudessem levar a uma flexibilização gradativa dos mecanismos da coerção legal, como por exemplo, acabar com o Ato Institucional n° 5 (AI- 5). No desenrolar desta ação, os atores principais da distensão política deram uma atenção especial ao sistema eleitoral, incluindo-se neste objetivo, a médio prazo, também, uma reforma partidária. Para o General Golbery, a repressão ilimitada, na busca de uma segurança absoluta, levaria, em última análise, à debilitação da segurança nacional pretendida (Alves:1987, p.186). A teoria da distensão, da forma como foi pensada, isto é, de forma lenta e gradual, pretendia, segundo seus autores, ser uma forma de legitimação do Estado autoritário então vigente. Mas esta não era uma tarefa fácil de ser desenvolvida porque uma ala da corporação militar, a chamada “linha dura” não concordava com tal estratégia. Portanto, como afirmamos anteriormente, essa era uma posição personalizada em alguns atores militares. 
                   A análise do período de governo dos Generais Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo e da atuação mais intensa do General Golbery na condução do processo de abertura política, mostrou também o uso de medidas de exceção além das medidas estratégicas para alcançar os objetivos traçados, tanto por parte dos Presidentes como de seu fiel escudeiro. Isto pode ser visto nas relações com lideranças do Exército, nas relações com a sociedade civil e também nas relações com a classe política. Que espécie de legado Figueiredo receberia de seu firme mentor? Geisel e Golbery levaram a liberalização mais longe do que todos os analistas políticos consideravam possível desde 1974 Mas importantes poderes arbitrários permaneciam, especialmente na Lei de Segurança Nacional (Skidmore: 1988, p. 49). É preciso que se diga, a bem da verdade, que a flexibilização do regime não excluiu perseguições, torturas, atos de exceção, mortes. Apesar delas, o processo avançou, chegando ao final do período Geisel, com a revogação do AI – 5.
             Já os seis anos do Governo Figueiredo caracterizaram-se pela política de abertura embora possam ser também caracterizados como limitadores de uma participação ampla dos setores até então excluídos do processo político. Entre os procedimentos que marcaram particularmente o primeiro ano de governo do General Figueiredo temos a anistia política, em agosto e a reforma partidária em dezembro. Porém, houve também uma sombra de retrocesso, na linha do terrorismo anti-comunista: a bomba no Riocentro. Nesse mesmo contexto a oposição avançava, ampliando sua participação na vida política nacional. Sua meta, agora, era a eleição direta para Presidente. O processo, uma vez desencadeado, envolveu diferentes setores da sociedade civil, que assumiram um importante papel no desenrolar dos acontecimentos. A Emenda apresentada pelo Deputado Dante de Oliveira, buscando eleições diretas, não foi aprovada no Congresso. A mobilização, porém, continuou, com a rearticulação das oposições, numa campanha aberta nas principais cidades do Brasil. Milhares de pessoas acorriam aos comícios e caminhadas ao lado de líderes políticos como Tancredo Neves, Ulisses Guimarães, Leonel Brizola e Luís Inácio Lula da Silva , além de intelectuais engajados e de representantes da Igreja, como D. Paulo Evaristo Arns. Edgard Luiz de Barros diz que as oposições partiram para convencer a sociedade [civil] de que a participação no Colégio Eleitoral criado pela ditadura, com um grande nome da oposição encabeçando a luta por mudanças, significaria a mesma derrota do autoritarismo (1994, p. 115). A realidade porém se apresentou com outra roupagem e a decisão sobre os candidatos foi mais de bastidores do que da força das ruas. 


PARA AQUELES QUE QUEREM APROFUNDAR MAIS SOBRE ESSE TEMA, SEGUE ABAIXO SUGESTÕES DE LEITURA DE PROFISSIONAIS RENOMADOS.. 

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS  
ALVES, Maria Helena Moreira. Estado e oposição no Brasil, 1964 – 1984. Petrópolis: Vozes, 1987. 

BARROS, Edgard Luiz de. Os governos militares. São Paulo: Contexto, 1994. 

BERNARD, Erançois de. L’ Emblème democratique. Paris: Éditions Mille et une nuits, 1998. 

BOBBIO, Norberto. Liberalismo e democracia. São Paulo: Brasiliense, 1990. 

CARVALHO, José Murilo de. La Ciudadania en el Brasil. Ciudad de México: Siglo Veinteuno, 1995. 

FREITAS, Décio. Rumo à pós-democracia?, in Zero Hora. Porto Alegre: s/d., 2003. 

GEDOZ, Sirlei. Idéias de democracia no Brasil: partidos políticos e Congresso Nacional, 1973-1987.Tese de doutoramento. Porto Alegre: PUC – RS, 2002. Digitalizada. 

MANIFESTO, in Resoluções e Encontros do Partido dos Trabalhadores: 1979 – 1998. Diretório Nacional do PT. Fundação Perseu Abramo, 1998. 

REIS, Daniel Aarão. Ditadura militar, esquerdas e sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000. 

RÉMOND, René (Org.) Por uma história política. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ; Fundação Getúlio Vargas, 1996. 

RIBEIRO, Renato Janine. A República. São Paulo: Publifolha, 2001. 

____________________. A política como espetáculo, in DAGNINO, Evelina (Org.). Anos 90: política e sociedade no Brasil. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1994. 

SANTOS, Wanderley Guilherme dos. Regresso: máscaras institucionais do liberalismo oligárquico. Rio de Janeiro: Opera Nostra Ed. 1994. 



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