A ESCOLA MODERNA E O EDUCADOR NECESSÁRIO
Por Alacir
Arruda
Em 1995, na França, um grupo de intelectuais convidados pela ONU
se reuniram para elaborar as características da escola e do aluno do século XXI.
Esse documento, denominado: “Educação um tesouro a descobrir”, além de conter os pilares daquilo que chamamos de educação moderna, orienta as escolas de como
encarar esse processo de transição. Pena que 99% delas não conhecem esse documento e continuam
no período medieval. A espinha
dorsal de qualquer escola é seu corpo docente que, nesse contexto, deve estar preparado
para cumprir suas tarefas. Esse educador
necessário deve ter algumas características fundamentais.
Em primeiro
lugar, ele deve estar comprometido politicamente com a sua tarefa de educador.
Esse comprometimento exige que as pessoas tenham consciência da
responsabilidade que lhes foi confiada. Não se é educador como se é operário de
uma fábrica de automóveis.
O educador não
pode julgar que a atividade da educação funciona do mesmo modo que a de um
trabalhador de fábrica. Não há como o educador começar a ser educador na hora
em que bate o ponto e deixar de sê-lo na hora em que o relógio indica o fim do
expediente.
Do educador se
exige uma constante ocupação com o ato educativo. Ele tem de ser. É uma
questão de ser e não uma questão de situação. Exige-se, portanto,
um crescimento dessa consciência política, que se obtém no próprio processo
político do trabalho. Essa consciência política não se obtém através de uma
verificação da tendência psicológica de alguém ou de um teste psicológico para
avalaiar a vocação. Mesmo porque as vocações também são históricas e se dão na
história.
À medida que o
educador, enquanto educador, compreende a importância social do seu trabalho, a
dimensão transformadora da sua ação, a importância social, cultural, coletiva e
política da sua tarefa, o seu compromisso cresce.
Ninguém é
comprometido, politicamente, de uma vez por todas. O compromisso é como um ato
de amor, que tem de se renovar diariamente. Na realidade, o ato de educação
exige necessariamente uma espécie de renovação diária do compromisso com o ato
educativo.
Em segundo
lugar, o professor comprometido politicamente tem de ser tecnicamente
competente. A competência técnica se renova da mesma forma que o compromisso
político. Nenhum professor está, em algum momento, adequadamente preparado.
Há de se
lembrar que a preparação técnica, a ampliação do conhecimento e a atualização
exigem um exercício freqüente e diário por parte do educador e do sistema no
qual ele está inserido. Mas, necessariamente, exigem vontade, desejo, carência
do profissional professor.
Aquele
educador que se sente comprometido politicamente já está com a vontade
direcionada para a sua preparação técnica. Não há como preparar alguém para o
exercício da função educativa se ele não se encontra, interiormente,
comprometido com essa função.
É por isso que
a questão do compromisso político é fundamental até para que se possa
desenvolver a competência técnica.
Não podemos
ter a ilusão de que os professores a partir de um determinado momento estão
preparados. Nenhum professor está preparado porque cursou a faculdade ou a
universidade, ou porque leu cinco, dez, cinqüenta ou duzentos livros, ouviu um
determinado número de conferências, participou de uma determinada quantidade de
cursos. Estes são instrumentos que podem auxiliar o processo de sua elevação
técnica. Em cada momento, temos educadores em níveis diferenciados de
preparação. O processo de preparação dos professores, tecnicamente, tem de
considerar o ponto de partida em que se encontra esse professor para que se
possa elevar sua competência técnica.
Em terceiro
lugar, se a escola se pretende democrática, o educador necessário para ela deve
assumir, democraticamente, a sua tarefa educativa. Como conseqüência, ele deve
compreender a importância coletiva do seu trabalho. Se não compreende, ou é
incapaz de compreender, que sua tarefa educativa não se encerra no âmbito de
sua disciplina, no período de sua aula e na sua forma de avaliação, ele não vai
concorrer para o exercício e para a formação de uma escola e de uma educação
democráticas.
Há de se
advertir aos educandos para compreenderem a importância do trabalho democrático
e, portanto, solidário e cooperativo no interior da escola e levá-los a se
despirem do individualismo e do egoísmo.
A atividade
pedagógica não é solitária: ela é uma atividade solidária. É a totalidade dos
atos pedagógicos no interior da escola que concorre para o seu crescimento e a
formação do educador e não a totalidade dos atos de qualquer professor,
individualmente considerado.
Por último, a
escola necessária exige, além de um educador com perfil diferente para o
trabalho escolar, também um currículo e uma organização administrativa
necessários.
- O CURRÌCULO
NECESSÁRIO
O que a escola
faz, de maneira essencial e fundamental, é aquilo que circula no seu interior,
como sua atividade principal, como sua matéria-prima fundamental: o
“currículo”. O currículo é o instrumento através do qual a escola vai preparar
o indivíduo para o exercício da cidadania. Aqui, também, com respeito ao
currículo, temos de pensar no que é permanente e no que é principal e no que
secundário, no que é secundário, no que é central e no que é periférico. Dentro
dele há uma essencialidade que, se não for cumprida, descaracteriza a escola, comprometendo
a função de preparação para a cidadania.
Lembremos que
a escola prepara para a cidadania através da prática – porque não se ensina
alguém somente através de discursos. Ensina-se através do discurso e da
prática. Pode-se fazer um discurso democrático na escola: se a prática da
escola é autoritária, se ensinará muito mais o comportamento autoritário do que
a prática democrática. A escola, para ensinar, precisa fazer o discurso da
democracia e executá-la; tem, inclusive, de demonstrar as dificuldades de se
praticá-la, pois faz parte do discurso da democracia dizer que praticá-la é
difícil, para que não se pense que praticar a democracia é a coisa mais fácil
do mundo. Faz parte do discurso da democracia demonstrar como, na prática, é
difícil praticá-la e mesmo entendê-la. Mesmo porque não temos nenhum exemplo
histórico no mundo ou na história da civilização do que constitui a sociedade
democrática. Temos instituições, homens, ações permeadas do espírito
democrático – mas a democracia, em seu estado puro, não existe. Então, a escola
ensina através da atividade curricular e através de sua prática.
Dissemos que é
fundamental saber qual é a essencialidade do currículo. Na preparação para a
cidadania, há duas questões que se colocam essenciais. Primeiro, compreender o
que se passa no mundo onde estamos vivendo. Segundo, compreender as formas de
agir e atuar neste mundo.
É discurso
bastante universal dizer que a escola precisa preparar o cidadão crítico. O
cidadão crítico não é apenas aquele que é capaz de fazer a crítica da
consciência. Ele tem que dominar, necessariamente, o conhecimento daquilo que
vai criticar. O cidadão é alguém capaz de distinguir as coisas na sociedade – o
verbo grego kritein, de onde vem a palavra CRÍTICA, significa
julgar, distinguir, analisar, separar. Ao fazer a crítica, tenho de ser capaz
de fazer distinção, julgamento, separação das coisas. Só posso fazer isso se
dominar o conhecimento sobre as coisas, sobre a realidade da qual vou fazer a
crítica.
Alacir, sugiro que vc monte um curso de capacitação voltado aos gestores das escolas de Cuiabá, como aqueles que vc ministrava em SP e RJ onde tive a oportunidade de assistir algumas aulas. O que acha? Eu participaria -------Miriam
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